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Publicado em 07 de dezembro de 2020 às 08h44min
Tag(s): Autonomia Universitária Democracia Universidades Federais
Reitores eleitos que não foram empossados publicaram carta aberta nesta sexta-feira (4) denunciando o golpe do governo Bolsonaro nas eleições internas das instituições federais de ensino. O texto ressalta que são antidemocracia as ações do Ministério da Educação e dos colegas servidores que aceitam atuar como interventores.
Do Rio Grande do Norte, três educadores se somaram à lista: José Arnóbio de Araújo Filho, eleito reitor do Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN); e o reitor e o vice-reitor eleitos da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa), Rodrigo Nogueira de Codes e Francisco Edcarlos Alves Leite, respectivamente.
No IFRN, o presidente nomeou em abril Josué Moreira, que sequer concorreu à eleição. O pleito, em dezembro de 2019, teve como vencedor Arnóbio, com 48,25% dos votos válidos, e em segundo lugar Wyllys Abel Farkatt Tabosa (reitor da gestão passada), com 42,26%.
Em agosto, a escolhida para gerir a Ufersa foi a professora Ludimilla Carvalho Serafim de Oliveira. Ela foi a terceira colocada na consulta feita à comunidade acadêmica, no mês de junho. Ludimilla teve 18,33% dos votos contra os 37,55% de Rodrigo Codes e 24,84% de Jean Berg.
A DEMOCRACIA PRECISA PREVALECER: CARTA ABERTA DAS
REITORAS E DOS REITORES/DIRETORES ELEITOS E NÃO EMPOSSADOS
A democracia é um valor que, para ser materializado, precisa ser praticado, e não apenas enunciado e debatido abstratamente. Não basta proclamar-se democrático. É preciso demonstrar, com ações, o respeito à vontade da Comunidade. E é justamente a falta desse respeito que vem sendo evidenciada, cada vez mais, pelas ações tanto do Ministério da Educação (MEC) quanto pelos colegas servidores que têm aceitado, contrariamente ao resultado das urnas, atuar como interventores ou como membros das equipes de intervenção nas Instituições Federais de Ensino que, desde 2019, tiveram negada a posse de suas reitoras e dos seus reitores/diretores eleitos.
Essa é a situação em que se encontram, nesta data, várias Instituições Federais de Ensino. Mesmo que seus futuros dirigentes tenham sido escolhidos em um ambiente verdadeiramente legítimo e democrático, essas Instituições sofrem as consequências amargas de procedimentos danosos de intervenção, enquanto buscam saídas por vias administrativas, políticas e até mesmo judiciais.
Do ponto de vista jurídico, os artigos 206 e 207 da Constituição Federal dispõem:
Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
(…)
II – Liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
(…)
VI – Gestão democrática do ensino público, na forma da lei;
Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.
Nesse sentido, as garantias constitucionais definem a autonomia universitária como um dos pilares do Estado Democrático de Direito. Ao afrontá-la, as recentes nomeações e indicações feitas pela Presidência da República, por iniciativa antidemocrática do MEC, criam uma imagem institucional bastante negativa, corroborando para que a sociedade civil veja com descrédito as Instituições e seus processos decisórios, que devem ser sempre democráticos.
Até que ponto uma intervenção pode sufocar e até mesmo levar à morte esses espaços educacionais que eram reconhecidos, anteriormente, apenas pela qualidade da formação dos estudantes, pela inovação de suas práticas e pela capacidade e formação de excelência de seus corpos docentes e técnico-administrativos? A pergunta é pertinente, pois o clima de medo, a ameaça de punições arbitrárias e o adoecimento físico e mental de suas comunidades são apenas algumas das formas já percebidas de respostas individuais e coletivas ao sufocamento lento, invisível e inaudível imposto pela atitude governamental antidemocrática.
Realmente, para que serve um processo eleitoral de grandes proporções, envolvendo milhares de servidores e estudantes em dezenas de cidades, se o seu resultado não for integralmente respeitado? A prática da democracia seria apenas uma mera formalidade na visão de nossos representantes políticos?
A intervenção nas Instituições Federais de Ensino e a indicação de reitores biônicos remontam aos tempos da Ditadura Militar no Brasil e não são aceitáveis no Estado Democrático de Direito, conquistado a partir de duras lutas políticas e sociais e que tem na Constituição de 1988 seu grande marco.
Nessas Instituições, são realizadas, há mais de 30 anos, eleições para a escolha do Dirigente Máximo. Nesse tempo, a Rede Federal de Educação nunca sofreu ataques tão duros a sua democracia como ocorre agora por parte do atual Governo.
Diante desse quadro, os signatários têm consciência de que, tal como em outros momentos difíceis da nossa história, é só pela luta e organização coletiva que ele poderá ser revertido. Atualmente, temos nos mobilizado nesse sentido em muitas instâncias, com grande apoio do Movimento Estudantil, do Movimento Sindical e de organizações da sociedade civil que valorizam a democracia.
Portanto, é para ampliar e fortalecer esta luta pelo respeito às Universidades e Institutos Federais que conclamamos a sociedade a se juntar a nós e exigir dos poderes constituídos que respeitem a democracia e a autonomia das instituições de ensino no país, obedecendo, portanto, as escolhas realizadas nelas, que devem ser acatadas na forma da lei e dos seus estatutos. Assim, consideramos relevante e histórico o entendimento do Excelentíssimo Senhor Ministro do Supremo Tribunal Federal, Luiz Edson Fachin, que, em manifestação oficial, declarou que as escolhas dos dirigentes máximos das Universidades e Institutos Federais devem seguir os seguintes requisitos:
– se ater aos nomes que figurem na respectiva lista tríplice;
– respeitar integralmente o procedimento e a forma da organização da lista pela instituição universitária;
– recaia sobre o docente indicado em primeiro lugar na lista.
Ocorre que acima de tudo e de todos está a Constituição de 1988. Ainda, conforme declara o Ministro Fachin em seu voto sobre a ADI 6565, “a nomeação de Reitores e Vice-Reitores não pode ser interpretada como dispositivo para o desenvolvimento de agendas políticas, ou como mecanismo de fiscalização” (…) “A nomeação não é instrumento de gestão porque não deve ser veículo de ingerência”. Nessa esteira, as eleições realizadas pelas Comunidades Acadêmicas vão ao encontro e são coerentes com o princípio democrático e com a autonomia universitária consagrados na Constituição de 1988. Por isso, nos juntamos a muitas vozes do passado e do presente para reafirmar: reitoras e reitores/diretores eleitos devem ser reitoras e reitores/diretores empossados!
Temos força para continuar e pedimos que cada vez mais pessoas e entidades juntem-se a nós, nessa batalha contra o autoritarismo, dentro e fora de nossas Instituições. Afinal, a democracia precisa prevalecer!
Brasil, novembro de 2020
Reitoras e reitores/ diretores eleitos
Anderson André Genro Alves Ribeiro (Reitor Eleito)
Lísia Regina Ferreira (Vice Reitora Eleita)
Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS)
André Macêdo Santana (Reitor Eleito)
Carlos Sait Pereira de Andrade (Vice Reitor Eleito)
Universidade Federal do Piauí (UFPI)
Etienne Biasotto (Reitor Eleito)
Cláudia Gonçalves de Lima (Vice Reitora Eleita)
Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD)
Ethel Leonor Noia Maciel (Reitora Eleita)
Universidade Federal do Espirito Santo (UFES)
Fabio Fonseca (Reitor Eleito)
Patrícia Maria Vieira (Vice Reitora Eleita)
Universidade Federal do Triângulo Mineiro (UFTM)
Georgina Goncalves dos Santos (Reitora Eleita)
José Pereira Mascarenhas Bisneto (Vice Reitor Eleito)
Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB)
Gilciano Saraiva Nogueira (Reitor Eleito)
Carlos Henrique Alexandrino (Vice Reitor Eleito)
Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Muriqui (UFVJM)
José Arnóbio de Araújo Filho (Reitor Eleito)
Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN)
Leonardo Villela de Castro
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO)
Maurício Gariba Júnior (Reitor Eleito)
Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC)
Maurício Saldanha Motta (Diretor Geral Eleito)
Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (CEFET-RJ)
Maurilio de Abreu Monteiro
Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA)
Rodrigo Nogueira de Codes (Reitor Eleito)
Francisco Edcarlos Alves Leite (Vice Reitor Eleito)
Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA)
Rui Vicente Oppermann
Jane Fraga Tutikian
Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
Telio Nobre Leite
Lúcia Marisy Souza Ribeiro de Oliveira
Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF)
Terezinha Domiciano Dantas Martins (Reitora Eleita)
Monica Nóbrega (Vice Reitora Eleita)
Universidade Federal da Paraíba (UFPB)
Fonte: Saiba Mais