Professor de geologia fala sobre julgamento no próximo dia 17

Publicado em 06 de novembro de 2009 às 18h14min

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Vanildo Pereira da Fonseca é professor do Departamento de Geologia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte há 19 anos, do qual já foi chefe e coordenador de curso. Fez Mestrado na UFMG, Doutorado na UFRGS e desenvolve pesquisas na área de Geologia Ambiental e Geomorfologia Costeira.
Durante uma aula de campo da disciplina de Geologia Geral, ministrada pelos professores Francisco Oliveira e Vanildo Pereira, no dia 07 de julho de 2006, um estudante do curso de geologia da UFRN sofreu um acidente fatal. O professor Vanildo Pereira, que acompanhava a turma na função de garante (responsável por qualquer anormalidade que venha a acontecer no exercício da profissão) informou que no percurso de subida ao Pico do Cabugi parte da turma se desviou da trilha sem autorização prévia provocando o acidente. Desde então o professor Vanildo, devido à ‘função de garante’, vem respondendo a processo por responsabilidade pelo acidente, com julgamento marcado para o próximo dia 17. Em entrevista à ADURN, o professor fala sobre o assunto.


Foram adotadas medidas básicas de segurança que, se não descumprida a trilha pelos alunos, poderiam ter evitado o acidente?

Antes de iniciar qualquer aula de campo, nós, profissionais da área, repassamos àqueles que irão nos acompanhar todo tipo de orientação prévia em sala de aula e/ou laboratórios. Além disso, ao longo das paradas de explanação de geologia, reforçamos os cuidados a serem tomados e os riscos do local – por menores que sejam eles. O aluno que desvia-se de uma trilha é o equivalente ao aluno que sai de sala de aula, sob o qual um único professor não tem a capacidade de manter controle. Na aula de campo isso se agrava devido a não termos previsão do que pode se modificar naquele momento. As alterações não estão sob nosso comando, são alterações naturais. Mas as medidas de segurança necessárias foram tomadas sem falhas.
Qual o posicionamento inicial da UFRN diante do caso?
A UFRN instalou imediatamente uma sindicância presidida pelo professor titular do Departamento de Geologia da Universidade, Emanoel Ferraz Jardim de Sá; pelo professor Djalma Ribeiro da Silva, do Departamento de Química; e pelo professor Ronaldo Fernandes Diniz, do IFRN. Essa sindicância apurou os fatos com base nos depoimentos dos alunos e professores envolvidos, e no material noticioso divulgado na mídia local, além de contar com a análise da questão por pessoas capacitadas da área. O que resultou em uma posterior determinação, pelo Reitor Ivonildo do Rego, de arquivamento dando por encerradas as investigações sobre o acidente. Manteve-se o processo criminal de acusação por parte da família da vítima.
Houve alguma atitude por parte da UFRN que demonstrasse o apoio na defesa da causa?
Acredito que não existiu, em momento algum, má vontade da universidade como instituição; mas um apoio direto acaba esbarrando nos impedimentos legais. Não cabe à Advocacia Geral da União defender àqueles que respondem a processo que se desdobra pela `função de garante`. Quanto aos alunos e colegas de profissão, nunca faltou apoio.
Além do apoio dos alunos e professores, a ADURN também abraçou a causa. Como isso aconteceu?
Diante do pronunciamento do desembargador no processo cível, o advogado que acompanhava a causa solicitou a contribuição de um advogado criminalista. O que só foi possível devido à decisão, em Assembléia Geral da ADURN, de usar o fundo de patrimônio da Associação para custear esse advogado. Não descarto aqui, pelo contrário, o apoio humano de todos que fazem a ADURN ao interpretarem que essa é realmente uma causa trabalhista e não criminal. Infelizmente, o cenário acusatório é algo do tipo ‘acusação criminal pelo exercício profissional’.
Mas tenho a certeza de ter tomado todas as medidas de segurança necessárias antes e depois do momento do acidente. É tanto que havia a possibilidade de me ser concedida a suspensão condicional do processo por eu ser réu primário, o que não aceitei.
Desde o acidente, as aulas de campo previstas em ementas e programas do curso de geologia foram reduzidas. Como isso reflete na qualidade do curso?
Frente ao cenário acusatório, o departamento de geologia decidiu pela suspensão do trabalho de campo. A partir daí, a UFRN criou uma comissão por meio da qual surgiu o Protocolo de Segurança que hoje serve para toda a Universidade.
Os professores do departamento de geologia – e, logicamente, aí eu me incluo – ainda se sentem receosos em organizar esse tipo de aula que é, sem sombra de dúvidas, primordial na formação dos nossos alunos. Como conseqüência, temos um prejuízo didático enorme. Professores de outras áreas são incumbidos de assumir determinados papéis para suprir essas lacunas, ao mesmo tempo em que nosso trabalho como especialistas está sendo posto em dúvida.
Com a conclusão do relatório pericial, o julgamento acontecerá no próximo dia 17. Como estão sendo esses momentos precedentes?
Com a leitura do processo é fácil notar a complexidade do caso. Serei julgado por não ter conseguido está presente ao lado dos 27 alunos que acompanhavam aula. Hoje, a justiça quer de nós professores com a ‘função de garante’, que sejamos quase “super heróis” com a capacidade de prever e evitar tudo de negativo. Lamento pelo o que aconteceu, mas estou seguro de tudo que fiz e conto com o apoio necessário à superação do problema. O questionamento que gira em torno do processo é: ‘orientar é ou não suficiente?’, e a decisão está na mão da justiça.
Quais as possíveis conseqüências se condenado no julgamento?
Se condenado, dentre as conseqüências, algumas serão a possibilidade de devolver à UFRN a indenização que está sendo paga a família do aluno, vítima do acidente; prestação de serviços comunitários; além da perda de direitos como: direitos políticos, de deslocamento da sede, de saída do país, entre outros. O único e mais valioso direito, por ser réu primário, não perderei: o de continuar dando aula na Universidade.
 

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