A votação estará disponível na segunda-feira, 22/11, às 08h.
Olá professor (a), seja bem-vindo (a) ao ADURN-Sindicato! Sua chegada é muito importante para o fortalecimento do Sindicato.
Para se filiar é necessário realizar 2 passos:
Você deve imprimir e preencher Ficha de Sindicalização e Autorização de Débito (abaixo), assinar, digitalizar e nos devolver neste e-mail: [email protected].
Ficha de sindicalização Autorização de DébitoAutorizar o desconto no seu contracheque na sua área no SIGEPE e que é de 1% do seu VB (Vencimento Básico).
Tutorial do SIGEPEFicamos a disposição para qualquer esclarecimento.
ADURN-Sindicato
Publicado em 25 de março de 2021 às 11h03min
Tag(s): Autonomia Universitária
A ADUFRGS-Sindical vem publicando uma série de entrevistas sobre autonomia universitária, assunto que preocupa toda a comunidade acadêmica. O objetivo do Sindicato é instigar a sociedade a debater o tema, defendendo a democracia e o respeito à escolha da comunidade nas eleições para reitor nas instituições públicas federais.
Nesta segunda entrevista da série, a ADUFRGS conversou com o sociólogo e professor aposentado da UFRGS, Renato Steckert de Oliveira. Ele foi presidente da ADUFRGS, (1994-1996 e 1996-1998), secretário de Estado de Ciência e Tecnologia do RS (período 2001- 2002), secretário de Estado Adjunto do Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia do RS (período 2015-2016).
Leia a entrevista.
O governo Bolsonaro tem se notabilizado por romper a tradição democrática em referendar a escolha da comunidade acadêmica das universidades. Quais são os prejuízos e as conseqüências para a universidade quando a escolha dos professores, técnicos e estudantes não é respeitada?
Renato Steckert de Oliveira – A nomeação de alguém que não seja o primeiro da lista tríplice encaminhada por uma universidade ao governo não constitui por si só um atentado à autonomia universitária. A universidade é autônoma e não soberana. A interferência da sua comunidade para a escolha dos dirigentes, estabelecida em lei, é limitada à composição de uma lista tríplice de candidatos, dentre os quais o presidente, em nome do Estado que, numa ordenação democrática, articula os interesses de toda a sociedade, escolherá um. O fato de tradicionalmente ser escolhido o primeiro da lista tríplice não confere nenhum direito suplementar à comunidade universitária além do estabelecido em lei, assim como a escolha de alguém que não seja o primeiro não retira nenhum direito da universidade e, por si só, não caracteriza nenhuma intervenção. Intervenção seria nomear alguém à revelia de qualquer processo interno de definição das listas tríplices, sem respeitar o que a lei determina.
O que deve-se fazer é cobrar de cada reitor ou reitora nomeados o respeito aos valores básicos da vida acadêmica: o pluralismo de ideias, o debate livre como base para a construção do conhecimento e para a definição das diretrizes institucionais, a liberdade acadêmica, a transparência na gestão, o fortalecimento dos órgãos colegiados da gestão administrativa e acadêmica, etc.
No seu entendimento, por que o presidente insiste em nomear quem não venceu a consulta para reitor dentro da universidade? É meramente por alinhamento ideológico ou é uma atitude de afronta à universidade pública?
Renato Steckert de Oliveira – Bolsonaro procura sempre alguém próximo à sua ideologia, pois não concebe o pluralismo de ideias. Além disso, como um tosco de extrema direita, associa os candidatos mais votados à condição de representantes do “esquerdismo-que-tomou-conta-das-universidades”. Não podemos esquecer que ele é do tempo do anticomunismo, o que por si só mostra o alcance do seu, digamos assim, pensamento.
Mas é difícil imaginar que todos os reitores nomeados com essa largueza de ideias sejam incondicionalmente seus vassalos, ou apoiem suas iniciativas contra as universidades públicas. Estas são muito mais articuladas e complexas, e tiveram sua maior expressão no projeto Future-se – que, diga-se de passagem, muitas lideranças acadêmicas não-bolsonaristas julgaram “interessante”…
A retirada daquele projeto não significou que o governo desistiu – revela apenas sua absoluta incapacidade de articular qualquer projeto ou qualquer iniciativa em qualquer área! Assim, as medidas contra as universidades públicas são tomadas no cotidiano do MEC, por uma burocracia absolutamente identificada com os interesses dos grandes grupos empresariais da educação, que agem com grande apoio do Congresso. Além disso, está em curso uma destruição do ensino fundamental e médio. Aqui também estão aproveitando a pandemia para fazer passar a boiada, como uma jornalista denunciou recentemente.
Acho que o movimento docente deveria estar muito mais atento a isto do que às nomeações de reitores.
Ao que o senhor atribui o comportamento deste governo contra as universidades públicas e a sistemática tentativa de intervir nas instituições, desrespeitando sua autonomia?
Renato Steckert de Oliveira – Em todos os setores de atividade, absolutamente todos!, este governo protege interesses empresariais predatórios! Sua cultura política, se é que podemos chamar assim, é uma cultura miliciana! Florestan Fernandes escreveu em “A Revolução Burguesa no Brasil” que a mentalidade média do empresariado brasileiro é a de que uma empresa, para realmente valer a pena, tem que ser uma espécie de mina de ouro. Talvez haja aí um exagero, mas é evidente que o país ainda não avançou o suficiente sequer para absorver um ethos capitalista em sentido pleno! Pois bem: para Bolsonaro e sua base social, o país inteiro tem que ser uma espécie de mina de ouro, do qual se extrai o máximo possível no mínimo de tempo possível, sem qualquer preocupação com o futuro! O Ministro do Meio Ambiente, para quem nossos mares, rios e florestas devem ser convertidos em pasto para bois, é a expressão mais despudorada dessa visão de mundo!
Ora, na educação superior não seria diferente. Temos um país com um dos maiores índices de privatização do ensino superior do mundo, com grupos empresariais que dividem suas instituições em “linhas populares” e “linhas premium”, como me disse certa vez, com a maior candura, um dirigente de um grupo educacional privado que atua no RS. É evidente que toda a regulamentação que mantêm as universidades públicas é um empecilho para esses grupos, então é necessário destruí-la. Simples assim!
No entanto, retomo o que respondi na primeira pergunta: até agora, a única iniciativa que vi de intervenção nas universidades foi com o projeto Future-se, quando se falou inclusive em prorrogar o mandato dos reitores. Nomeação de segundos ou terceiros colocados nas listas tríplices não qualifica, por si só, intervenção. Fernando Henrique Cardoso fez isto, assim como o primeiro reitor eleito da UFRGS não foi nomeado, num período em que a existência das universidades públicas e sua necessidade para o país não estavam colocadas em questão.
Como o senhor avalia o papel das entidades sindicais para tentar conter os ataques do governo Bolsonaro contra a autonomia das instituições federais de ensino?
Renato Steckert de Oliveira – Não há como conter os ataques do governo Bolsonaro sem dar um basta ao governo Bolsonaro! Está cada vez mais claro para a maioria dos cidadãos que o governo Bolsonaro tem que ser contido antes que seja tarde! As razões morais, políticas, econômicas e os meios legais para isto estão disponíveis, e esta é a agenda cada vez mais imperativa para toda a sociedade!
Para fortalecer esta agenda os sindicatos de docentes devem, antes de mais nada, repensar sua estratégia. Ao invés de iniciativas centradas no discurso da autonomia universitária, que é um valor difícil de ser compreendido e, até mesmo, não compartilhado por uma parte expressiva da população (por falta de informação, baixo nível educacional, falta de percepção sobre o papel da ciência na vida social, etc.), sendo, por isto mesmo, facilmente confundido com corporativismo, deve-se buscar alianças a partir de interesses e necessidades concretas da população, principalmente dos setores mais vulneráveis. Porque os sindicatos docentes não mobilizam as universidades para ações de combate à fome, por exemplo, não apenas se limitando às campanhas de doações de alimentos, mas utilizando o conhecimento científico para buscar soluções de produção e distribuição de alimentos nas periferias urbanas, etc.? Ao longo dos últimos anos a sociedade brasileira regrediu enormemente, perdendo grande parte do legado de organização autônoma dos movimentos sociais que haviam sido constituídos nas três últimas décadas do século XX. Reconstituir os laços de solidariedade que aqueles movimentos representavam, e, sobretudo, reconstituir os canais de comunicação entre os setores populares e a universidade é absolutamente fundamental para superarmos a atual crise e não só defender como ampliar a universidade pública.
Ao mesmo tempo, deve-se buscar alianças com setores empresariais que estão ameaçados pela desindustrialização que o país vem sofrendo há pelo menos duas décadas (a rigor, desde o Plano Real!), defendendo a necessidade de um projeto de desenvolvimento nacional que articule minimamente o potencial das universidades com o potencial e as necessidades econômicas do país. O espaço do debate público sobre desenvolvimento foi tomado (e anulado!) pelo discurso do empreendedorismo, pelo movimento das startups, e a universidade tornou-se uma incubadora desse movimento. É claro que esses movimentos são importantes e necessários para abrir novas perspectivas a uma economia que ainda padece de métodos oligárquicos. No entanto, a universidade não pode, em nome deles, abdicar do seu papel crítico de referência de vida intelectual engajada. Frente a esses novos fenômenos, os sindicatos docentes esvaziaram-se, oscilando entre o aplauso de ocasião à “competência” da universidade pública e a defesa de pautas pouco compreensíveis pela maioria da população.
No movimento estudantil isto é ainda pior, pois enquanto os estudantes mobilizam-se para “vencer na vida” através do empreendedorismo e da “inovação”, as entidades estudantis permanecem presas a um discurso político que vem perdendo audiência e representatividade há pelo menos trinta anos!
O senhor foi presidente da ADUFRGS na década de 90, época que tivemos um grande número de greves dos professores. Hoje, neste governo, os servidores estão sofrendo uma série de ataques aos direitos conquistados ao longo dos anos. Como é possível agir contra um governo que não está aberto ao contraditório e não negocia com as entidades sindicais?
Renato Steckert de Oliveira – As greves dos anos 80 e 90 não foram as únicas formas de ação do movimento docente naquele período. Houve avanços importantes que resultaram de negociações entre as associações de docentes lideradas pela ANDES (assim mesmo, do gênero feminino, pois era uma Associação Nacional de Docentes do Ensino Superior ainda sem o estatuto legal de sindicato!) e o governo.
Durante o período final da ditadura havia a perspectiva de que estávamos ampliando os espaços da democracia, e a própria ditadura, engajada no que se chamava “distensão lenta, gradual e segura” do regime, aceitava negociar reivindicações, obviamente que com limitações. Avançamos conquistas importantes sem greves e perdemos reivindicações importantes mesmo com greves!
Com a redemocratização houve um amplo distensionamento político, e no início as greves deixaram de fazer parte da agenda do movimento docente. Elas passaram a ser o recurso último para pressionar por negociações, e, por mais que isto pareça óbvio, é importante frisar: havia sempre a perspectiva concreta de negociações sobre pautas específicas, pelo simples fato de que, divergências com os governos à parte, havia uma cultura democrática mínima que ordenava as relações entre universidade e governo. Em suma, as greves não eram políticas, no sentido de enfrentamento aos governos. A única ocasião em que se tentou transformar uma greve por reajuste salarial em greve política foi em 1998, quando a então diretoria do ANDES (agora já do gênero masculino…) tentou transformar a greve (uma das mais massivas da história da universidade!) num movimento para enfraquecer Fernando Henrique Cardoso nas eleições presidenciais daquele ano, mesmo ao preço da derrota da reivindicação salarial! O movimento foi tão estapafúrdio que em plena greve a diretoria foi derrotada nas eleições para sua sucessão, não conseguindo eleger a chapa que daria continuidade à sua política! Como resultado da negociação encaminhada pela diretoria eleita, que presidi, os docentes tiveram um dos maiores, se não o maior, reajustes salariais da história.
A diferença é que, hoje, embora continuemos sob o mesmo ordenamento jurídico-institucional da democracia de 1988, o governo Bolsonaro não se identifica com esse ordenamento. Não só não se identifica como ameaça a todo momento com a volta de uma ditadura! Portanto não há que se pensar em negociação ou manutenção de nossas conquistas. Elas estão ameaçadas a todo momento! Em consequência, qualquer iniciativa sob este governo deve ser construída na perspectiva de uma greve política! Uma greve contra o governo que se articule com o conjunto dos movimentos dos trabalhadores e dos setores democráticos da sociedade para que possamos reconstruir a democracia no Brasil!
Fonte: ADUFRGS