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Publicado em 17 de maio de 2021 às 09h45min
Tag(s): Educação Pandemia de coronavírus
Em audiência no Senado, líder do laboratório que monitora a covid-19 em tempo real na USP, o benefício do retorno às aulas pode ser superado pelas perdas
São Paulo – A reabertura das escolas sem a testagem em larga escala antes da vacinação contra a covid-19 é condenada pelo professor de medicina Domingos Alves, da USP de Ribeirão Preto. Em audiência pública no Senado nesta sexta-feira (14), para discutir estratégias para o retorno seguro às aulas presenciais, ele afirmou que os benefícios em reabrir escolas e universidades para aulas presenciais não podem ser ultrapassados pelas perdas acarretadas pela iniciativa.
“O que é necessário é uma solução real para o problema. E não uma solução falsa, que torne o problema da pandemia ainda mais grave. Os níveis seguros (para a reabertura) resultam da redução da transmissão comunitária, que deve ser a medida real para autorizar o retorno das atividades presenciais. Para isso é preciso rastreamento de casos e isolamento”, explicou Alves, que lidera o Laboratório de Inteligência em Saúde (LIS), que monitora a covid-19 em tempo real com base na ciência de dados.
O especialista contestou dados apresentados pelo médico Marcio Sommer Bittencourt, do Hospital Universitário (HU) da USP, de que crianças se contaminam menos e transmitem menos o novo coronavírus, além de sofrerem menos complicações e óbitos que os adultos.
“Até agosto de 2020, o número de mortes na faixa etária de 0 a 19 anos causadas pela covid-19 era de 718, o que correspondia a 0,68% do total de óbitos pela doença em todo o país. No começo de abril, o número subiu para 5.216, equivalente a 1,43% do total de casos”, disse, com base em estatísticas de boletins do Ministério da Saúde.
Alves também contestou argumento do epidemiologista Wanderson de Oliveira, então técnico da pasta e da equipe do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta. Atual secretário de Serviços Integrados de Saúde do Supremo Tribunal Federal (STF), Wanderson defendeu a reabertura das escolas, especialmente em munícipios onde o número de novos casos diários em grupos de 100 mil habitantes seja inferior a 5. “Até onde eu seu, nenhum município chegou a esse patamar”, afirmou.
Defendida pelo Fundo Internacional da ONU para a Infância (Unicef) para a redução das desigualdades sociais e educacionais, a reabertura das escolas, inclusive universidades federais, é tema do projeto de Lei (PL) 5.595/2020. A proposta inclui a educação no rol dos serviços essenciais. Aprovado na Câmara, o PL que agora tramita no Senado é de autoria da deputada e empresária apoiadora de Bolsonaro Paula Belmonte (Cidadania-DF). Ela é casada com Luis Felipe Belmonte, Aliança pelo Brasil, mas o projeto naufragou. Luís Felipe Belmonte, um dos fundadores da Aliança Pelo Brasil, partido criado para abrigar Bolsonaro, mas cujo projeto naufragou. Por sua vez, ele é investigado em inquérito que apura financiamento de atos antidemocráticos, além de ser suspeito de enriquecimento ilícito. .
Na audiência, o representante do Ministério da Educação, Mauro Luis Rabelo, defendeu o retorno imediato das aulas presenciais, alegando que repasses de programas mantidos pelo governo federal são suficientes para garantir a implementação de medidas de segurança. Mas não acenou recursos novos para essa finalidade.
A fala de Rabelo foi contestada pela gestora de educação no município de Oliveira (MG), Andrea Pereira da Silva, que representou a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime). E também pela vice-presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), Joana Angélica Guimarães, reitora da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB).
“Não há como fazer educação remota, porque a maioria dos alunos não tem computadores e nem acesso à internet. E o direito à educação pressupõe o direito à vida: Não podemos fechar os olhos a todos os problemas nas escolas que impedem um retorno seguro. E os recursos para isso são insuficientes”, disse Andrea. O veto do presidente Jair Bolsonaro à Lei da Conectividade, que prevê recursos para compra de tablets e acesso à banda larga deverá ser apreciado no Senado nesta próxima semana.
Joana afirmou que as universidades vêm se preparando para o retorno às aulas. Já há aulas presenciais em alguns cursos em diversas instituições, ao passo que avança o ensino híbrido. Mas quaisquer medidas requerem investimentos, enquanto o setor enfrenta cortes orçamentários e recursos em patamares iguais aos de 2004. “Essa discussão é muito importante. Educação é essencial. Mas não há vacinas para todos. E pensar em um retorno fica muito difícil com grande redução de recursos. Esta é a grande questão”.
A crítica ao retorno e ao PL que o determina foram criticados ainda pela deputada Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), relatora do PL 2.949/2020, do retono seguro. “Precisamos construir condições para que escolas funcionem para receber os alunos”, disse, destacando a situação de quase metade delas. Segundo dados oficiais, 49% sequer tem água, carteira e pátio para atividades externas. Já muitas outras chegam a ter a circulação de 1.500 alunos.
A senadora Zenaide Maia (Pros-RN) fez coro à fala de Dorinha: “Quem lida com educação está mais do que consciente do papel da escola além do ensino, da socialização e também na segurança alimentar de grande parte de alunos – pilares estes que foram apropriados pelos defensores da reabertura das escolas. E questionou a importância do PL em discussão. “Paula (Belmonte), com todo respeito, não há necessidade desse PL para melhorar a educação. A gente já sabe o que precisa para o retorno: vacinação”.
Iniciativa do senador Jean Paul Prates (PT-RN), a audiência ouviu ainda, entre outros palestrantes, o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo. O dirigente pediu a aprovação do “PL do retorno seguro” e a derrubada dos vetos no PL da Conectividade . “O PL 5.595 nos leva à infecção e morte.”
Também manifestou-se o professor da Faculdade de Educação da USP, Daniel Cara, que pediu ao Senado mudanças no PL 5.595 aprovado na Câmara. Entre elas, retirar a menção da educação presencial como serviço ou atividade essencial. E inserir que o retorno presencial deverá ser quando for seguro do ponto de vista epidemiológico. “Reitero a necessidade de o Senado fazer as alterações necessárias e encaminhe no sentido de construir um retorno seguro às atividades presenciais nas escolas brasileiras”
Fonte: Rede Brasil Atual