Entidades que representam a comunidade de Ciência, Tecnologia & Inovação (CT&I) do País enviaram uma carta ao ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Marcos Pontes, pedindo que seja convocada imediatamente uma reunião do Conselho Diretor do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
O objetivo é atuar em conjunto para garantir que os R$ 5,1 bilhões da extinta Reserva de Contingência do fundo sejam imediata e integralmente liberados para a função estabelecida em lei, que é o financiamento da pesquisa científica e tecnológica.
Na mensagem ao ministro, as entidades recordam que a movimentação dos recursos do FNDCT é prevista em lei aprovada pelo Congresso Nacional por ampla margem de votos favoráveis, em votações realizadas em dezembro e em março. Porém, em ofício (SEI nº 118771, de 07 de maio de 2021) encaminhado ao MCTI, o Ministério da Economia solicitou que os recursos do fundo sejam direcionados a outras políticas públicas a serem definidos pelos ministérios.
As entidades ressaltam que, conforme determina a Lei 11.540/07, em seu artigo 5º, inciso IV, cabe ao Conselho Diretor do FNDCT “a definição das políticas, diretrizes e normas para utilização dos recursos”, bem como “aprovar a programação orçamentária e financeira.”
“Portanto, não cabe à Junta de Execução Orçamentária, como anunciado no Ofício mencionado (do ME), decidir sobre a destinação dos recursos do FNDCT, já que essa é uma atribuição do seu Conselho Diretor como prescreve a lei”, alertam os assinantes da mensagem.
Além de Ildeu Moreira, presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), a carta é assinada pelos presidentes da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (Anprotec), Francisco Saboya Albuquerque Neto; da Academia Brasileira de Ciências (ABC), Luiz Davidovich; da Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (Anpei), Rafael Correa Fabra Navarro; Gianna Sagazio, Diretora de Inovação da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e ex-membro do Conselho Diretor do FNDCT (2016-2020) e Helena B. Nader, vice-presidente da ABC e membro atual do Conselho Diretor do FNDCT.
Leia a íntegra da carta enviada ao ministro Pontes:
Senhor Ministro,
Os avanços da ciência, tecnologia e inovação (CT&I) têm se mostrado imprescindíveis para superação da crise sanitária, econômica e social, em razão da pandemia de Covid-19. Assim, torna-se ainda mais urgente a discussão sobre o fomento público à CT&I.
Os países da OCDE investem em média mais de 2% do PIB em pesquisa e desenvolvimento (P&D), sendo que países como Coreia do Sul e Israel, reconhecidamente inovadores, investem mais de 4% do PIB. Já o Brasil, em 2018, investiu pouco mais de 1% e estima-se que, em 2020, tenha investido menos de 1% do PIB.
Na contramão dos países mais inovadores, o Brasil perdeu 15 posições no índice Global de Inovação, nos últimos dez anos. Ocupa hoje a 62ª posição, em 131 países, o que não é compatível, mesmo tendo caído para 12ª posição no ranking das maiores economias do mundo, com a capacidade econômica e social do país.
O sistema nacional de ciência e tecnologia, consolidado nas últimas décadas, está em vias de colapso. Os sucessivos cortes orçamentários precarizam universidades e institutos de pesquisa, afetando seriamente a pesquisa realizada nessas instituições e a formação adequada de profissionais. O investimento escasso em P&D prejudica a inovação e a recuperação da economia.
Como entidades representativas da comunidade de CT&I do país, unindo empresas, Universidades, institutos de pesquisa e sociedade civil organizada, que cooperam pelo avanço do setor e de seus benefícios para sociedade, dirigimo-nos a V. Ex.a considerando a aprovação recente da LC 177/2021, que extinguiu a Reserva de Contingência do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Tal aprovação resultou de uma expressiva mobilização, gerando uma vitória conquistada com muito esforço, pelo trabalho conjugado de todos nós junto ao Congresso Nacional.
Em Ofício SEI nº 118771, de 07 de maio de 2021, o Ministério da Economia (ME) acatou a demanda do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI) pela liberação dos recursos do FNDCT. Contudo, essa liberação foi acompanhada de definição, pelo ME, da destinação de parte desses recursos e, ainda, de solicitação para identificação de políticas públicas não financiadas por recursos do FNDCT, que possam passar a ser custeadas pelo Fundo. Assim, trazemos-lhe algumas considerações e solicitações.
A Lei 11.540/07 define, em seu artigo 5º, inciso IV, que cabe ao Conselho Diretor do Fundo, “a definição das políticas, diretrizes e normas para utilização dos recursos”, bem como “aprovar a programação orçamentária e financeira”. Portanto, não cabe à Junta de Execução Orçamentária, como anunciado no Ofício mencionado, decidir sobre a destinação dos recursos do FNDCT, já que essa é uma atribuição do seu Conselho Diretor como prescreve a lei.
O Projeto de Lei Complementar 135/2020 nasceu com o objetivo de assegurar que os recursos do FNDCT sejam utilizados na sua totalidade em sua finalidade, que é desenvolver CT&I no Brasil. O PLP também visava garantir a correta destinação legal dos recursos e a desvinculação de seus saldos anuais aos ciclos orçamentários dos anos fiscais, por meio da transformação do fundo em contábil e financeiro. Com a aprovação da LC 177/2021, fica assegurado um fluxo constante de investimentos, compatível com os ciclos de desenvolvimento e maturação de atividades de pesquisa e projetos de inovação empresarial.
Tendo em vista as razões acima expostas, consideramos inadequadas as decisões adotadas pela referida Junta. Parece haver uma estratégia de postergação na liberação dos recursos não reembolsáveis, que implica em não haver tempo hábil para serem utilizados ainda em 2021.
Recentemente, o Ministro da Economia, Paulo Guedes, em audiência no Congresso Nacional, afirmou que “o Ministro Marcos Pontes acaba de receber R$ 5 bilhões a mais para o orçamento dele”, o que de fato não ocorreu. No referido ofício, o ME solicita ao MCTI que sejam identificadas possibilidades de substituição do orçamento do Poder Executivo pelo orçamento do FNDCT. No entanto, a atribuição legal e a responsabilidade pela definição do uso dos recursos do FNDCT são de seu Conselho Diretor.
Em função disso, encaminhamos as seguintes solicitações:
- Que o MCTI convoque imediatamente uma reunião do Conselho Diretor do FNDCT, para que ele possa analisar a situação do FNDCT e cumprir a sua função estabelecida em lei, a de definir o uso e a distribuição dos recursos desse Fundo;
- Que a definição e distribuição dos recursos do FNDCT resultem das decisões do seu Conselho Diretor, informadas pelas discussões com os diversos setores da área de CT&I, respeitadas as injunções legais existentes, e que não sejam definidas ou impostas por qualquer outro órgão ou autoridade, como parece ser a pretensão do ME;
- Que atuemos em conjunto e com firmeza para que os R$ 5,1 bilhões da extinta Reserva de Contingência do FNDCT sejam imediatamente e integralmente liberados como um recurso adicional e não retirados, como pretende o ME, do próprio orçamento do
Considerando os fatos apresentados, os representantes das entidades que assinam esta carta contam com a sua sensibilidade e ação em favor da CT&I no Brasil.
Cordialmente,
Ildeu de Castro Moreira, Presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC)
Francisco Saboya Albuquerque Neto, Presidente da Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores (ANPROTEC)
Gianna Sagazio, Diretora de Inovação da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e ex-membro do Conselho Diretor do FNDCT (2016-2020)
Helena B. Nader, Vice-Presidente da ABC e membro atual do Conselho Diretor do FNDCT
Luiz Davidovich, Presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC) e ex-membro do Conselho Diretor (2016-2020)
Rafael Correa Fabra Navarro, Presidente da Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (ANPEI)
Fonte: Jornal da Ciência