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Publicado em 29 de junho de 2021 às 09h38min
Tag(s): Reforma Administrativa
Se não tivessem estabilidade, que a reforma Administrativa quer acabar, tanto Miranda, que denunciou esquema de compra superfaturada da Covaxin, quanto Saraiva, que denunciou Salles, teriam sido demitidos
FOTO DELEGADO SARAIVA: POLÍCIA FEDERAL / FOTO LUIS RICARDO MIRANDA: JEFFERSON RUDY-AG. SENADO
A conduta do servidor público do Ministério da Saúde, Luís Ricardo de Miranda, que na última sexta-feira (25) depôs na CPI da Covid-19 do Senado e confirmou denúncias sobre irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin, não apenas reforça a importância da estabilidade na carreira dos servidores como acende um alerta sobre o que pode acontecer, caso a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 32, da reforma Administrativa, encaminhada ao Congresso Nacional pelo presidente Jair Bolsonaro (ex-PSL), seja aprovada.
Tanto Luís Ricardo, que expôs o esquema para comprar de vacina supertafatura em 1000% no Ministério da Saúde, quanto o delegado da Polícia Federal Alexandre Saraiva, que enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma notícia-crime contra o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, foram muito citados nas redes sociais neste fim de semana.
Em todos os casos, os internautas relacionaram o fato de ambos serem servidores públicos e terem estabilidade com as denúncias que fizeram e a reforma Administrativa que quer acabar com a estabilidade e liberar a contratração de um milhão de indicados por políticos.
Saraiva até perdeu o cargo de Superintendente da PF do Amazonas, mas não pode ser demitido porque é concursado.
Já Miranda, que também não pode ser demitido, após as denúncias na CPI teve bloqueado o acesso ao sistema operacional do ministério, por meio do qual ele exerce suas funções de servidor público, mas permanece no cargo e também não pode ser demitido.
Se não tivessem estabilidade, provavelmente já estariam fazendo parte das estatísticas de desemprego do país.
Um dos tuites sobre a importância da estabilidade do servidor público mais compartilhados foi o do jornalista da Tv Globo, André Trigueiro, que escreveu: ”Aos que vociferam contra a estabilidade dos servidores: Quem denuncia irregularidades na compra da Covaxin é um servidor concursado. Quem denunciou o ex-ministro Salles por supostas irregularidades com madeira ilegal foi um servidor concursado. Fariam isso sem a estabilidade?”, questionou.
Para o secretário de Finanças da Confederação Nacional dos Trabalhadores no Serviço Público Federal (Condsef) e diretor executivo da CUT, Pedro Armengol, “é muito grave a situação” do servidor impedido de acessar o sistema por ter feito a sua obrigação de funcionário público, mas seria pior se a reforma Administrativa estivesse em vigor e ele tivesse perdido a estabilidade.
E, justamente por ter estabilidade no cargo é que Miranda e Saraiva não sofreram nenhuma outra consequência como a demissão, diz Armengol. “Se não tivessem estabilidade, tanto Miranda quanto Saraiva teriam sido demitidos. No caso de Miranda, que foi com o irmão deputado avisar Bolsonaro, seria demitido antes de fazer a denúncia ao Ministério Público e a CPI da Covid. A sociedade brasileira teria continuado a ser lesada sem saber”.
E aí é que está a grande diferença entre ter e não ter estabilidade. Se um servidor é comissionado, indicado pelo governo da ocasião, ele ou fica refém da gestão ou é alguém já alinhado, trabalhando em consonância com os interesses do político – “presidente, deputado, prefeito, seja quem for”, diz o dirigente.
A estabilidade serve para defender a sociedade e não o servidor público, que é empregado da sociedade brasileira e não do Bolsonaro, neste caso específico, afirma Armengol.
De acordo com os princípios do serviço público, o servidor tem que prestar contas ao povo brasileiro que paga seu salário por meio de impostos e não ao gestor.
Para servir bem à sociedade, o servidor tem que ter segurança, não pode ficar à disposição da boa vontade do gestor, que na maioria dos casos não é funcionário de carreira e que está lá para atender aos interesses de quem o indicou
Para Sérgio Ronaldo, Secretário-Geral da Condsef, os envolvidos no esquema montado na vacina indiana, não imaginaram que Miranda teria a coragem para fazer a denúncia. “Servidor não se intimida em denunciar irregularidades e o que lhe dá segurança é a estabilidade. Imagina se um servidor não tem isso”.
Para o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo, tanto o caso de Miranda quanto o do delegado, servem como exemplos para denunciar interesse escusos da reforma Administrativa.
A reforma ampliará o controle do poder público sobre o servidor, impedindo que ele cumpra o papel de zelar pelas tarefas de atender e servir à população. Haverá uma grande distorção dos princípios constitucionais e fundamentais do serviço público. Destruição do serviço público, em português direto.
Desta forma, diz Heleno, em casos de denúncias de irregularidades, “se fosse um funcionário indicado, ao fazer uma denúncia seria demitido, ou pior, o próprio servidor já seria um indicado do governo que poderia facilitar o ilícito”.
Assim como Armengol, o presidente da CNTE, afirma que se hoje permitido que poder público controlasse servidor, Miranda e Teixeira já estariam totalmente prejudicados, demitidos e sem uma justificativa para a sociedade. “Sem termos conhecimento das denúncias”, ele diz.
Sérgio Ronaldo ainda complementa que “é isso que que eles querem fazer. Querem acabar com a estabilidade para continuar reinando, com essa anarquia da roubalheira que eles pretendem com a reforma Administrativa”.
“Bolsonaro quer aprovar para continuar indicado seus comparsas”, ele diz.
Servidor há mais de 44 anos, Armengol reforça que os trabalhadores da categoria não estão isentos de punição em casos de má conduta, ao contrário do que reza a cartilha dos conservadores e neoliberais que querem aprovar a reforma.
No regime jurídico de contratação, para o servidor público, mesmo com a estabilidade, há uma série de mecanismos que preveem demissão caso cometa irregularidades. No entanto, diferentemente da iniciativa privada, é aberto um processo administrativo para apurar os casos.
“O que diferencia é que ele não tem patrão fisicamente identificado. Em princípio é o governo, mas quem paga é a sociedade. Para demitir precisa de um processo administrativo. E isso acontece. Nos governos de Lula e Dilma, por exemplo, houve mais de 10 mil demissões de servidores envolvidos em irregularidades”, diz Armengol.
Armengol afirma que o servidor Luis Ricardo Miranda deve denunciar o caso de ter sido bloqueado no acesso ao sistema ao Ministério Público Federal (MPF).
O Deputado Alexandre Padilha (PT-SP) também se solidarizou ao servidor e afirmou que entrará com uma representação no MPF questionando o caso.
Sérgio Ronaldo afirmou que a Condsef se colocou à disposição do servidor Luis Ricardo Miranda para, caso ele deseje, ter assessoria jurídica para se defender.
Edição: Marize Muniz
Fonte: CUT Brasil