Em debate sobre ‘os colapsos’ do Brasil de Bolsonaro, cientistas defendem educação para a democracia

Publicado em 09 de setembro de 2021 às 10h45min

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País sofre, presidente direciona forças para investidas golpistas. “Não há possibilidade de uma independência verdadeira sem uma população que aprenda o que é democracia”

Todos temas essenciais ao país são ignorados, negligenciados, pelo governo Jair Bolsonaro (Reprodução/TVT)
 

São Paulo – Diante de um cenário de retrocesso a passos largos em diferentes campos – e para marcar a passagem do Dia da Independência –, a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) realizou o debate virtual intitulado “Bicentenário da Independência: crises e recursos de enfrentamento”. O encontro foi mediado pelo presidente da entidade, Renato Janine Ribeiro, que fez um balanço das várias faces da crise que assola o país sob o governo de Jair Bolsonaro. Além disso, cientistas de diferentes áreas de atuação foram unânimes em apontar para a necessidade de investimento em educação política no Brasil.

Entre os temas abordados, a volta do país ao Mapa da Fome fome, o aumento da pobreza, a maior crise sanitária da história, a devastação ambiental sem precedentes, desemprego, inflação, crise energética e até mesmo o mercado financeiro com fuga de investidores e quedas bruscas no mercado de ações. Todos temas negligenciados por Bolsonaro, que prefere colocar todo seu empenho em uma aventura golpista contra as contra as instituições e a democracia.

Educar para libertar

“Não há possibilidade de uma independência verdadeira sem uma população que aprenda, não só a ler e escrever, a ter raciocínio matemático. Mas também o que é democracia”, afirmou Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da Fundação Getulio Vargas (FGV). Durante o governo Bolsonaro, aumentou o déficit educacional do brasileiro. O número de estudantes fora das universidades subiu de 30% para 35,9% no ensino presencial e de 35% para 40% no ensino à distância, entre 2019 e 2020. Os dados são do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Mais de 5,5 milhões de crianças e adolescentes não têm acesso ao ensino.

O ministro da Educação, Milton Ribeiro, já disse explicitamente que a universidade deve ser “para poucos”. Instituições históricas de referência internacional no ensino superior passam por ataques constantes das bases governistas. Além da falta de incentivos, ataques ideológicos, interferências no conteúdo disciplinar e a quebra da autonomia universitária, com a imposição de reitores favoráveis ao governo. “Não precisa ser bolsonarista, só não pode ser esquerdista”, disse Ribeiro sobre a escolha de reitores.

“O ensino superior é reconhecido como um dos principais motores para o crescimento, a prosperidade e a competitividade econômica, tanto no próprio país como globalmente”, prosseguiu Claudia. Além disso, o ensino foi apontado como essencial para a construção cidadã. Um escudo para evitar a cooptação de parte da população por golpistas e investidas destrutivas para o país, a partir de um processo de desinformação.

Colapso e resistência

Após os discursos golpistas de Bolsonaro neste 7 de setembro – em que pregou desrespeito à Justiça, entre outros crimes de responsabilidade – os problemas do país se agravam. O reflexo imediato foi a queda de quase 4% da bolsa de valores de São Paulo (Ibovespa), a alta expressiva do dólar. Além disso, a inflação corrói o poder de compra da classe trabalhadora e aproxima cada vez mais camadas do fantasma da fome. Trata-se de um “projeto de colapso”, alertaram os cientistas.

“Essa crise vai ser vencida. Mas ela não vai ser vencida por simples obra do acaso. Ela vai ser vencida porque é preciso que nós resistamos. E nós vamos continuar trabalhando, e não vamos perder a esperança. Também vamos nos mobilizar para fazer uma virada política, porque não podemos continuar vivendo um retrocesso tão grande”, afirmou Sergio Machado Rezende, professor titular no Departamento de Física da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

Rezende completou: “O Brasil vai voltar a ser uma nação respeitada, soberana, como éramos, em todas as áreas. E para isso nós precisamos ser independentes, precisamos de ciência, de ciência interdisciplinar, acoplada com as necessidades da população. Com isso vamos poder construir uma nação que seja minimamente sustentável, socialmente mais justa e economicamente mais equitativa entre todos nós”.

Insegurança e impeachment

Durante o debate, o governo Bolsonaro também foi mais uma vez responsabilizado pela devastação ambiental sem precedentes na história recente do Brasil. “Já são contabilizados 36.226,09 quilômetros quadrados em avisos de desmatamento somente na área da Amazônia Legal. Isso leva a uma consequente crise hídrica e energética. Nós estamos esgotando os recursos naturais do nosso planeta, estamos esgotando sua capacidade de fornecer serviços ecossistêmicos para nós próprios — e isso é uma questão que a sociedade como um todo tem que discutir”, disse o professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), Paulo Artaxo.

A insegurança hídrica e energética soma-se à alimentar. Dados da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan), apontam que 19 milhões de brasileiros passam atualmente por situação de fome, e 14,5 milhões de famílias vivem na extrema-pobreza. “Enquanto Bolsonaro ataca as instituições e faz ameaças golpistas, a miséria no Brasil aumenta e 1,2 milhão de pessoas aguardam na fila do programa Bolsa Família. Bolsonaro não sabe o que fazer para resolver os problemas reais da vida da população. O impeachment é a única solução”, alertou o deputado federal Henrique Fontana (PT-RS).

Limite

O também parlamentar Jorge Solla (PT-BA), defendeu que a situação ultrapassou os limites do aceitável. “O Brasil não suporta mais um ano de Bolsonaro. O colapso social e o nível de tensão institucional criados por Bolsonaro ultrapassaram todos os limites. Desemprego, fome, inflação, crise energética. E ele só pensa em golpe para evitar que ele e sua família parem na prisão. Chega”.

A senadora Leila Barros (PSB-DF) também somou na crítica à postura presidencial. “Não bastassem as diversas crises simultâneas que atormentam a população, o Brasil atravessa uma crise político-institucional que se agravou neste 7 de Setembro. O presidente da República tem abdicado de procurar soluções para os problemas do país e ele próprio passou a ser um gerador de problemas e turbulências. Enquanto o presidente utiliza o dinheiro público e a estrutura do governo federal para atacar instituições e fazer campanha política indevida, a crise sanitária persiste, a inflação dispara, o poder aquisitivo das famílias desmancha, o desemprego continua provocando sofrimento”.

Covid-19

As investidas golpistas de Bolsonaro acabaram por afastar os holofotes de uma realidade que segue imperativa no Brasil: a tragédia diária da covid-19. Desde o início da pandemia, em março de 2020, o presidente rejeitou a ciência, disseminou mentiras sobre a segurança de máscaras e vacinas, desprezou mortes e a gravidade da doença, além de ter incentivado e promovido aglomerações. Entre elas, a de ontem, onde apoiadores e membros do governo, incluindo ele, não utilizaram máscaras.

O resultado é que o Brasil é o segundo país com mais mortes pelo vírus no mundo. São 584.171 vítimas, sem contar ampla subnotificação pela ausência de políticas de combate à pandemia, que incluiria a realização de mais testes. Hoje (8), foram mais 361 vítimas em 24 horas, e 13.645 novos casos. Ao menos 20.913.578 brasileiros foram infectados. Os números são do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (Conass). Os números refletem um menor contingente de profissionais de saúde diagnóstica em atividade no feriado prolongado encerrado ontem e tendem a ser retificados nos próximos dias . Muitas dessas mortes seriam evitáveis, de acordo com cientistas, não fosse a negligência do governo federal.

Números da covid-19 desta quarta-feira (8) no Brasil. Fonte: Conass

Fonte: Rede Brasil Atual

 
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