Na pandemia, maioria das plataformas de ensino virtual violaram a privacidade de crianças e adolescentes

Publicado em 12 de julho de 2022 às 13h07min

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Estudo da Human Rights Watch identificou que, no Brasil, plataformas utilizadas pelos governos de São Paulo e Minas Gerais compartilharam informações de estudantes com terceiros

A maior parte dos produtos de tecnologia educacional indicados por governos ao redor do mundo para que estudantes pudessem estudar remotamente durante a pandemia violaram os direitos de crianças e adolescentes. A conclusão é da Human Rights Watch, que analisou 163 plataformas de ‘edtech’ endossados por 49 países durante o período.

Dos 163 produtos avaliados, 145 (89%) vigiaram ou tinham capacidade de vigiar crianças e adolescentes e mergulharam profundamente em suas vidas privadas. Muitos produtos coletaram informações sensíveis sobre esses estudantes – como, por exemplo, quem eram, onde estavam, o que faziam durante a aula, quem eram seus familiares e amigos e que tipo de dispositivo suas famílias poderiam pagar para que eles pudessem seguir os estudos on-line.

A análise técnica, feita pela organização entre março e agosto de 2021, deu origem ao relatório Como eles ousam espiar minha privacidade?, publicado em maio deste ano. 

‘Algumas ainda coletavam e registravam os hábitos dos estudantes de maneira invisível e impossível de evitar ou deletar – mesmo que os estudantes, seus pais, mães, responsáveis legais e professores estivessem cientes e tivessem o desejo e o conhecimento tecnológico para fazê-lo – sem jogar o dispositivo no lixo”, diz um trecho do relatório.

Mais que isso, as plataformas também enviaram ou concederam acesso a dados de crianças e adolescentes para terceiros, normalmente para empresas de tecnologia de publicidade (adtechs). .“Ao fazê-lo, elas parecem ter permitido aos algoritmos sofisticados de empresas de adtech a oportunidade de unir e analisar esses dados para adivinhar as características e interesses pessoais de uma criança ou adolescente, e prever o que ele ou ela poderia fazer e como poderia ser influenciada. O acesso a essas informações poderia então ser vendido para qualquer pessoa – anunciantes, corretores de dados (data brokers) e outros – que buscassem impactar um grupo definido de pessoas com características semelhantes online”, acrescenta a análise.

O estudo identificou 145 produtos de EdTech enviando diretamente ou concedendo acesso a dados pessoais de crianças e adolescentes para 196 empresas terceirizadas, em sua maioria esmagadora AdTechs. “Descobrimos que o número de empresas de AdTech que recebiam dados de crianças e adolescentes era muito maior do que as empresas de EdTech que enviavam esses dados a elas”, aponta a análise. 

“Alguns produtos de EdTech direcionaram publicidade comportamental a crianças e adolescentes. Ao usar os dados das crianças e adolescentes – extraídos de ambientes educacionais – para direcioná-las com conteúdo personalizado e anúncios que as seguem pela Internet, essas empresas não apenas distorceram as experiências online das crianças e adolescentes, mas também correram o risco de influenciar suas opiniões e crenças em um momento de suas vidas em que sofrem alto risco de manipulação”.

A constatação é a de que dos 42 governos que forneceram educação on-line diretamente para as crianças e adolescentes, criando e oferecendo seus próprios produtos de edtech para uso durante a pandemia, 39 governos produziram produtos que lidaram com dados pessoais de crianças e adolescentes de maneiras que arriscavam ou violavam seus direitos. ‘Alguns desses governos tornaram obrigatórios para alunos e professores o uso de seus produtos de edtech,  não apenas os sujeitando aos riscos de uso indevido ou exploração de seus dados, mas também impossibilitando que estudantes se protegessem optando por alternativas de acesso à sua educação’.

Casos em Minas e São Paulo No Brasil, o estudo identificou o compartilhamento de dados de crianças e adolescentes em plataformas online utilizadas pelos estados de Minas Gerais, caso da iniciativa ‘Estude em Casa’, e São Paulo, via Centro de Mídias da Educação, plataforma oficial do estado, e outras como Descomplica, Revisa Enem, Dragon Learn, Escola Mais, Explicae, Manga High e Stoodi.

A Humans Right Watch alerta que os governos têm ‘a responsabilidade final sobre o fracasso de proteger o direito das crianças e adolescentes à educação’.

‘Os governos devem realizar auditorias de privacidade de dados das EdTech endossadas para o aprendizado de estudantes durante a pandemia, remover aquelas que falharem nessas auditorias e notificar e orientar imediatamente as escolas, professores, pais e crianças afetados a fim de evitar coleta e uso indevido de dados das crianças e adolescentes’.

Nesse sentido, aponta a urgência em se adotar medidas de reparação diante a coleta indevida de dados de crianças e adolescentes. “As empresas devem inventariar e identificar todos os dados de crianças e adolescentes coletados durante a pandemia e garantir que não processem, compartilhem ou utilizem dados de crianças e adolescentes para fins não educacionais. As empresas de AdTech devem excluir imediatamente quaisquer dados de crianças e adolescentes que tenham recebido; as empresas de EdTech devem trabalhar com os governos para definir regras claras sobre retenção e exclusão de dados de crianças e adolescentes coletados durante a pandemia”, finaliza.

Fonte: Carta Capital

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