Novas universidades ampliam vagas, mas sofrem com falta de estrutura

Publicado em 02 de março de 2010 às 11h53min

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A criação e a consolidação, nos últimos cinco anos, de 15 universidades federais distantes dos grandes centros urbanos cumpriram o objetivo do governo de aumentar o número de cursos e vagas no ensino superior público brasileiro. No entanto, na velocidade que foi feita, a expansão transformou municípios espalhados pelo interior do país em canteiros de grandes obras, com alunos tendo aulas em prédios improvisados, sem infraestrutura e com quantidade insuficiente de professores.
Levantamento feito pelo Estado nas novas unidades mostra que os problemas e as reclamações se repetem em todas as regiões - e que até que as instituições se consolidem, uma geração de universitários está se formando em condições mais precárias do que gostariam.
Para o Ministério da Educação, os problemas enfrentados pelas novas instituições são normais quando se tem um crescimento acelerado e, aos poucos, a situação deve ser resolvida. O MEC planeja contratar mais 1.097 professores neste ano e outros 1.858 até 2012.
Consolidação
No Rio Grande do Norte, por exemplo, foi criada a Universidade Federal Rural do Semiárido (Ufersa) a partir da Escola Superior de Agricultura de Mossoró, de 1967. Em quatro anos, a Ufersa quadruplicou o número de cursos e vagas. E há planos de dois novos campi.
"Temos salas e laboratórios superlotados. O laboratório para 20 alunos é usado por 50", disse o estudante Flávio Luiz Barbosa Magalhães. No campus de Angicos, a situação é pior: não há laboratório e aulas práticas são "empurradas" para frente.
O pró-reitor de graduação, José Arimatéa de Matos, reconhece que há 52 obras em andamento, mas diz que a infraestrutura para as disciplinas básicas está em funcionamento. Encontrar professores tem sido outro desafio, e editais foram reabertos duas vezes. "É difícil preencher as vagas. Primeiro abrimos só para doutores. Se não temos inscritos, mudamos os pré-requisitos."
Em Minas, o reitor da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e do Mucuri, Pedro Angelo Almeida Abreu, também reconhece a falta de docentes. "O país não estava preparado para a abertura de 18 mil vagas de professores com doutorado."Abreu avalia que a situação é transitória.
Fundada em 1953 como Faculdade Federal de Odontologia de Diamantina, a instituição foi elevada à universidade em setembro de 2005. Hoje tem 32 cursos de graduação. Mas o campus de Teófilo Otoni foi entregue no semestre passado. O acesso é feito por estrada de terra - e as aulas ficaram suspensas por duas semanas porque choveu e o local ficou inacessível. No início do mês, o presidente Lula foi vaiado por alunos durante evento de inauguração de dois prédios da instituição.
Segundo a reitoria, estão sendo edificados nove prédios no campus de Teófilo Otoni e há cem obras em andamento em Diamantina. O aluno Magno Ferreira diz que está tudo em obras, mas acredita que os problemas são secundários em relação ao privilégio de ter uma universidade pública na região.
Outro caso desse tipo é o da Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS), criada com sede em Chapecó (SC) a partir de um movimento liderado pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul e pela Via Campesina. A instituição tem instalações provisórias em quatro dos cinco campi, e os projetos pedagógicos dos 42 cursos estão em "processo de elaboração".
Lá, a oferta de 2.160 vagas deve exceder a demanda. Nove cursos tiveram menos de um inscrito por vaga. No caso dos professores, a situação também é essa - 148 das 163 vagas foram preenchidas.
Na Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), das 83 vagas para docentes, 51 foram ocupadas. Na Federal de Alfenas, dois dos três campi no interior de Minas estão em prédios provisórios. No Paraná, alguns alunos da Universidade Federal Tecnológica do Paraná, que tem unidades em 11 cidades, têm aulas em prédios improvisados. Segundo o reitor Carlos Eduardo Cantarelli, as obras estão dentro do previsto. "Os dois blocos que vão dar suporte à unidade estão em fase final de construção."
A mais recente em implantação é a Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), que terá campus em Foz do Iguaçu (PR), com projeto de Oscar Niemeyer. Como o prédio não começou a ser construído, a Unila terá sede temporária no Parque Tecnológico de Itaipu, para os cursos bilíngues com vagas para alunos dos países vizinhos. A previsão é de que os cursos comecem no segundo semestre.
O campus de Bagé da Universidade Federal do Pampa (Unipampa) chegou ao seu quarto ano de atividades com improvisos. Alunos e professores se queixam de dificuldades para deslocamentos e da falta de salas e laboratórios. O principal problema, apontam, é o atraso das obras.
Se o conjunto de cinco blocos interligados estivesse pronto, como na previsão, as atividades acadêmicas passariam a se concentrar no bairro Ivo Ferronato, a seis quilômetros do centro. Teria acesso asfaltado e linhas de ônibus até as proximidades.
Por enquanto, o que se vê no local é a placa com informações, como o custo de R$ 19,9 milhões da construção e a data de término prevista para 20 de fevereiro deste ano. Ao fundo, a estrutura do prédio erguida e a imensidão do pampa.
Enquanto isso, as atividades estão distribuídas por seis locais diferentes. Num deles funciona a reitoria. Os alunos têm aulas em outros cinco. A prefeitura de Bagé cedeu o prédio de um antigo posto de saúde e uma sala do Colégio São Pedro. E a Unipampa também ocupa salas da Universidade Estadual do Rio Grande do Sul (Uergs), em sistema de compartilhamento, e do Colégio Auxiliadora, privado, por locação. Alugou ainda o edifício de uma clínica desativada para instalar laboratórios. Outros, mais complexos, dependem de salas adequadas.
A falta de espaços adaptados criou uma situação paradoxal. Há equipamentos armazenados em depósitos, à espera de instalação. Há livros ainda empacotados na biblioteca, sem lugar para todo o acervo.
O aluno Felipe Ramos Lima, de 21 anos, que cursa Engenharia Renováveis e Ambiente, tem de usar sua bicicleta para percorrer os quatro quilômetros entre o prédio conhecido como "sede" e o da Uergs. Ele tem dez minutos entre o fim de uma aula e o início de outra. "Nesses casos a estratégia dos colegas é pedir para sair um pouco antes a um professor e para chegar um pouco depois a outro", relata Felipe. Seu colega William de Moraes, de 19 anos, chegou a fazer o trajeto duas vezes ao dia, a pé, no semestre passado.
O que mais preocupa os dois, no entanto, é a falta de laboratórios. "Como o engenheiro vai se formar se nunca entrar num laboratório?", questiona. Mesmo se dizendo um pouco frustrado, Felipe afirma que só a criação da Unipampa lhe abriu a possibilidade de frequentar um curso superior. "Antes eu não tinha essa previsão", recorda.
Além de Bagé, a Unipampa tem campus em outras nove cidades. Para a reitora Maria Beatriz Luce, os desafios decorrem da ampla região geográfica em que a instituição está distribuída. "As cidades ficam entre 1 e 8 horas de distância", explica. Segundo ela, o desenvolvimento econômico da região era estagnado e a intenção da universidade é ajudar a melhorar o desempenho.

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