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Publicado em 01 de novembro de 2022 às 15h47min
Tag(s): Pesquisa Científica Saúde
“Eu estou com 69 anos, nunca fui a um médico para nada. Meu médico é a planta do mato”. A cearense Socorro Miguel Potyguara, do povo Potyguara é raizeira e utiliza dos saberes da sua etnia nos cuidados com a saúde. Socorro tem colaborado com a iniciativa Ser Povos, um projeto coordenado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), com o objetivo de produzir conhecimento em comunhão com a luta indígena pela garantia do direito à saúde.
A ação aborda saberes e experiências inovadoras de cuidado em saúde desenvolvidas nos territórios rurais ou das populações do campo, da floresta e das águas; através de pesquisa-ação-participativa.
Assista ao vídeo:
Entre abril de 2021 a março de 2022, o Ser Povos realizou uma pesquisa no território indígena da Serra das Matas, que abrange os municípios de Monsenhor Tabosa, Tamboril, Santa Quitéria e Boa Viagem, no Ceará, para acompanhar o andamento das políticas de saúde em 34 aldeias.
Segundo Vanira Matos, pesquisadora da Fiocruz, esta pesquisa teve como intuito promover uma ruptura com a invisibilidade dos indígenas que habitam o território da Serra das Matas, e fortalecer o direito à saúde por meio da valorização dos saberes ancestrais, em diálogo com o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena (SasiSUS).
“A pesquisa teve como eixo central essa escuta e essa percepção desse território das aldeias; a gente percorreu 34 aldeias para junto com os povos indígenas, produzir materiais que trouxessem a memória das tradições indígenas que existem ali”, explica a pesquisadora, que complementa. “São povos que têm um modo de vida e guardam uma identidade e uma cultura da tradição dos povos indígenas que habitam esse território e que passam por muita invisibilidade. Eles tinham essa demanda de que eles passassem a ser reconhecidos como povos indígenas”.
Essa pesquisa faz parte de um processo de reconhecimento da cultura e práticas dos povos originários no território Semiárido cearense. Um povo que tenta manter a sua língua, costumes medicinais e saberes ancestrais vivos através dos ensinamentos. Com a ajuda do Ser Povos, a memória medicinal dos povos indígenas da Serra das Matas agora está na internet, em vídeos e minidocumentários que registram o dia e as lições que a sabedoria indígena tem para nos contar.
A pesquisa de ação participativa envolveu diretamente 110 indígenas; entre lideranças locais, pajés, caciques, raizeiros, rezadeiras, profissionais da educação e saúde. Eles trabalharam com a equipe de pesquisa na concepção de produtos que reforçam a junção dos saberes ancestrais e científicos e que atualmente circulam nas escolas e unidades de saúde das aldeias, como reitera Vanira.
“Pra que eles passem a ter um reconhecimento tanto dos povos indígenas, como do subsistema, como da sociedade cearense, como pessoas que trazem toda uma cultura ancestral que, nesse encontro com a nossa sociedade contemporânea, traz grandes aprendizados e lições da trajetória de resiliência e sobrevivência desses povos no nosso sertão”, avalia.
Nos meses de atuação da pesquisa, foram realizadas rodas de conversas, seminários e visitas às residências e quintais com cultivos de plantas utilizadas em rituais de cura, para troca e aprimoramento de saberes ancestrais, que seguem sendo compartilhados, como mostra Joice Potyguara. “Eu vou dizer para que serve essa árvore. O nome dela é Oliveiras e ela serve pros arcos pulmonares, pro coração e pra infecção na urina. É como minha mãe falou, se um dia ela não lembrar mais, eu posso ensinar a ela como eu já sei algumas coisas eu já sei ensinar pra toda minha família e todo mundo, porque todo mundo tem uma responsabilidade”,
O relatório construído com a pesquisa levantou informações para caracterizar brevemente os povos indígenas da Serra das Matas e dos municípios vizinhos em relação às condições sanitárias e socioambientais ligadas à saúde. A pesquisa foi concebida dentro da teia de saberes da iniciativa Ser Povos, em parceria com o Movimento Potygatapuia e o Movimento Indígena Tabajara da Serra das Matas, com fomento do Programa Inova Fiocruz. Todas as produções podem ser acessadas no site.
Fonte: BdF Pernambuco