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Publicado em 03 de fevereiro de 2023 às 09h20min
Tag(s): universidade
Além de permitir que o Ministério da Educação se tornasse um balcão de negócios para propinas em troca de barras de ouro e de agir para desmontar todo o setor de ciência e tecnologia do país, o governo de Jair Bolsonaro também trabalhou ativamente para reduzir a liberdade acadêmica no Brasil.
É o que indica o estudo “A liberdade acadêmica está em risco no Brasil?”, realizado pelo Observatório do Conhecimento, rede da qual a APUB, sindicato federado ao PROIFES-Federação, faz parte, em parceria com o Centro de Análise da Liberdade e do Autoritarismo (LAUT) e com o Observatório Pesquisa, Ciência e Liberdade da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), cujos dados da primeira fase foram divulgados em julho de 2022.
Foram entrevistados 1.116 cientistas e pesquisadores brasileiros entre agosto e dezembro de 2021.A segunda fase da pesquisa será qualitativa, com enfoque no relato dos professores e pesquisadores que enfrentaram algum tipo de represália ou censura.
“É importante estarmos atentos aos resultados deixados pelo governo Bolsonaro no cenário educacional, é por meio de dados como esse que conseguimos dimensionar o estado da educação brasileira. A partir disso podemos estabelecer um caminho de reconstrução onde a educação pública de qualidade e a valorização do servidor e da ciência voltam a ter protagonismo dentro das políticas públicas”, afirmou o presidente do PROIFES-Federação, professor Nilton Brandão.
Maioria conhece experiências de interferência indevida
Os dados da pesquisa são um indicador do efeito nefasto das políticas de Bolsonaro para a ciência e a educação em nosso país: 58% dos entrevistados disseram conhecer experiências de pessoas que tiveram limitações ou interferências indevidas em pesquisas ou aulas, enquanto 27% dos entrevistados afirmam já ter limitado aspectos de seu trabalho de pesquisa com medo de consequências negativas, e 43% consideram ruins ou péssimas as condições oferecidas por suas instituições para lidar com ameaças à liberdade acadêmica.
Segundo a pesquisa, professores e pesquisadores mais afetados proporcionalmente por ameaças e violações à liberdade acadêmica estão vinculados, em primeiro lugar, à área de Ciências Humanas e Ciências Sociais Aplicadas, seguida das Ciências da Saúde.
O relatório preliminar com os dados da primeira fase do estudo também indica ser “notável” a proporção de entrevistados da área de Linguística, Letras e Artes que já limitaram o conteúdo de suas aulas por receio de retaliações ou consequências negativas que independem de critérios acadêmicos.
O relatório destaca, ainda, que a violação da liberdade acadêmica em nosso país durante o governo Bolsonaro “está disseminada por todas as áreas do conhecimento”.
Por que algumas áreas sofrem mais perseguição?
A guerra de setores extremistas contra as Ciências Humanas não é novidade. O que mudou nos últimos anos é a virulência dos ataques, com a disseminação de fake news em massa para distorcer a compreensão da sociedade sobre os propósitos dos estudos das humanidades.
Movimentos extremistas, como o fascismo e sua versão brasileira – o bolsonarismo –, só existem a partir da desumanização de seus militantes. Isso explica a aversão deles aos estudos da sociedade e dos problemas que afetam o cotidiano da população, ou às reflexões sobre aspectos endógenos e exógenos dos indivíduos.
Já as perseguições e ameaças aos pesquisadores da Saúde aumentaram muito durante a pandemia de Covid-19, já que os extremistas, seguindo a linha de Bolsonaro e de sua base de apoio, adotaram discursos negacionistas como forma de reduzir as medidas de prevenção, contenção, enfrentamento e vacinação contra a doença, enquanto faziam propaganda para medicamentos sem eficácia comprovada.
Professores x família?
Os resultados apresentados pelo Observatório do Conhecimento e seus parceiros de investigação corroboram o que outros especialistas e trabalhos acadêmicos têm indicado: a retórica extremista distorce a percepção de parte da população sobre o trabalho desenvolvido por docentes e pesquisadores.
Uma pesquisa realizada pelo Grupo de Políticas Públicas para o Acesso à Informação (GPoPAI), da Universidade de São Paulo, entrevistou 2.308 pessoas em São Paulo. 64% dos entrevistados que eram eleitores de Bolsonaro disseram concordar com a afirmação: “professores estão abordando temas que contrariam os valores das famílias”.
Obviamente, são observações sem provas e sem conhecimento da realidade, formuladas a partir do recebimento de fake news e discursos de ódio produzidos pela máquina bolsonarista. Mas o alto índice de respostas nesse sentido mostra que o apoio a Bolsonaro está diretamente ligado à percepção distorcida da realidade.
A proporção cai para 37% entre os “bolsonaristas arrependidos” (que votaram em Bolsonaro em 2018, mas não pretendiam repetir a opção em 2022), e apenas 16% entre eleitores de outros candidatos.
Fonte: APUB