Professor da UFRN é destaque do ano na comunicação com página de memes

Publicado em 18 de dezembro de 2023 às 10h43min

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Quando criou o Saquinho de Lixo com mais cinco amigos em 2018, o pernambucano e professor da UFRN, Rodrigo Almeida, 38, não imaginava que uma página de memes o catapultaria como um dos destaques da comunicação. 

Nascido “de uma forma muito despretensiosa”, diz Rodrigo, hoje o Saquinho acumula mais de dois milhões de seguidores só no Instagram e virou empresa — um hub criativo que já desenvolveu projetos para gigantes como Ambev, TikTok, Schutz e Coca-Cola.

Na última quinta—feira (14), o sexteto por trás da página de memes foi anunciado como parte das 30 vozes que lutaram para mudar a indústria da comunicação em 2023. Além de Rodrigo, os outros cofundadores são Alan Pereira, Daví Vosk, Luis Porto, Júlio Emílio e Sofía De Carvalho. A lista é feita pelo coletivo Papel & Caneta, que destaca iniciativas e profissionais que ajudam o mercado criativo a se transformar.

Cineasta e professor de Audiovisual no Departamento de Comunicação Social (Decom) da UFRN, Rodrigo Almeida é formado em Jornalismo pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e doutor em Comunicação. É docente da UFRN desde 2018, mesmo ano em que o Saquinho ganhou vida.

“Eu fiquei super feliz e um tanto surpreso”, diz o cineasta, que participou neste mês da cerimônia da Papel & Caneta que aconteceu em São Paulo.

Como hub criativo Saquinho Mídias Criativas, o grupo trabalha na elaboração de roteiros, mapeamento de criadores de conteúdo, criação de estratégias criativas, projetos audiovisuais e memes para marcas. Além de sócio—fundador, Almeida é o diretor cultural da empresa.

“A linguagem memética, para nós, é um meio de identificação em massa e para a massa”, diz o site do hub.

Talvez, ainda assim, não seja fácil explicar qual o tipo de humor que fez ganhar a identificação de mais de dois milhões de saquiners, como são chamados os seguidores da página.

“É engraçado porque o nome Saquinho de Lixo remete a uma coisa meio sujinha, mas também fofa. Acho que o conteúdo que é curado ou produzido pelo Saquinho geralmente tem essa dinâmica”, busca definir Almeida.

“Às vezes são coisas engraçadinhas fofas, mas também tem às vezes coisas bem nojentas. Muitas vezes é um conteúdo que seria o chorume da internet, o lixo, mas que a gente ressignifica dando outras potencialidades, e aí se torna algo que se conecta com as pessoas”, pensa.

O cineasta carrega um longo currículo: atua também como pesquisador, curador, escritor, cineasta e fotógrafo. Na UFRN, costuma lecionar disciplinas como Teorias das Imagens e edição e montagem no audiovisual. 

“Eu particularmente acredito que o meme se tornou um elemento de comunicação fundamental para a gente pensar a área hoje. É algo que está no consumo, no dia a dia da maioria das pessoas, e muitas vezes faz parte do diálogo entre amigos, colegas, paqueras, aulas”, diz Rodrigo. 

“São elementos que são usados o tempo todo pra gente às vezes entrar em determinados assuntos, comentar determinadas realidades, determinados fenômenos, então acho que é um recurso que realmente chegou e se estabeleceu como uma espécie de linguagem própria, que faz muito sucesso, que de fato torna as coisas um pouco mais leves, mesmo quando são questões super sérias que são tratadas ali”, explica o pernambucano.

O Saquinho não busca ser isento, tanto que já nasceu fazendo meme em meio às eleições presidenciais de 2018 (“e isso fez dar um up na página”, diz Almeida). Todos os seis criadores são nordestinos — cinco pernambucanos e um cearense — e todos LGBT. Não à toa, a página também já ganhou prêmios voltados especificamente à comunidade LGBT. Almeida vê ainda esse senso de comunidade entre os próprios seguidores. Foi isto que motivou os criadores a estabelecerem algumas “diretrizes políticas”, de acordo com o cineasta.

“É uma página claramente de esquerda, feita exclusivamente por pessoas do Nordeste. Há uma questão aí de territorialidade, de identidade regional ligada ao Nordeste muito forte. Muitas pessoas, inclusive, às vezes ficam surpresas, o que diz mais sobre as pessoas do que sobre a gente, do fato do Saquinho ser uma página feita por nordestinos”, comenta.

Mas o que leva tantas pessoas LGBT a se identificarem com a página?

“Há um certo humor dentro desse segmento específico, que talvez nos coloque mais em diálogo com esse público, mas ao mesmo tempo fortalece os nossos vínculos com os seguidores do Saquinho”, acredita o criador de conteúdo.

Para ele, até alguns anos atrás a identidade do Saquinho ainda não estava tão bem definida, o que levava a surgir alguns seguidores que ainda não sabiam bem qual era a “vibe” da página.

“Mas eu acho que quando você começa a seguir, depois de pouco tempo percebe que tem uma gay ali por trás, que tem essas pessoas nordestinas ali por trás”, brinca.

A certeza de ser novamente uma página com compromisso político veio na quinta (14), quando o Saquinho fez uma publicação em collab com a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e com a Melted Vídeos, outra gigante dos memes, com 2,1 milhões de seguidores no Instagram.

O post criticava a derrubada dos vetos do presidente Lula (PT) ao marco temporal para demarcação de terras indígenas pelo Congresso. Mas havia crítica ao próprio Lula pela falta de incisão sobre o tema. A imagem que abria o carrossel apresentava um iceberg com uma pequena ponta para fora da água, visível, e a maior parte do gelo imerso sob o mar. 

“Desfilar na posse com lideranças indígenas e de proteção ambiental”, dizia a pequena parte visível do gelo.

“Não vetar completamente leis que podem dizimar povos indígenas e áreas de proteção ambiental”, contrapunha o iceberg “escondido”.

“Hoje (14) o congresso nacional nos condenou a viver tempos de devastação. A derrubada dos vetos ao PL 2903 atesta a política de um congresso ruralista que só pensa em dominar e destruir terras e bens naturais, em favor do lucro próprio. Temos uma maioria congressista invasora de terra indígena e violadora do direito à vida”, apontava a legenda do post entre Saquinho, Apib e Melted.

“A gente está sempre dialogando sistematicamente com o universo da política. Isso está no cerne do nascimento ou do crescimento do Saquinho”, reivindica o pesquisador da UFRN.

Em pleno fim de semestre na UFRN, a rotina do professor está mais corrida do que o usual. Isso porque, além da necessidade de fechar todas as notas, de participar de bancas de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) e dos alunos correndo atrás dele nos minutos finais para não serem reprovados, Almeida foi eleito em outubro para a chefia do Decom. É uma responsabilidade a mais, já que ele se manteve lecionando as disciplinas em que já estava antes de assumir o cargo de chefe de departamento.

Para conseguir dar conta de tudo, o professor reivindica uma boa gestão de tempo. Mesmo sendo professor de Comunicação e administrando uma página de humor, todas as notificações do celular do professor são desativadas, para evitar ser “chamado” pelo brilho do aparelho. No Saquinho, há ainda uma divisão de horários e turnos para cada administrador.

“A gente já tem essa divisão há muito tempo. Todo mundo sabe mais ou menos qual o horário que vai postar”, explica Almeida.

Mas é claro que, em determinadas ocasiões, surge um hot topic, como define o docente: algum acontecimento inesperado que bomba de uma hora para outra, e novos materiais precisam ser pensados rapidamente. 

“Tipo assim, a Luísa Sonza na Ana Maria Braga lendo carta sobre a traição do Chico Moedas. Não tem como deixar isso passar”, afirma. 

“Porque isso vai ser o boom do que as pessoas vão falar pelo próximo dia. Então tem esses tópicos que invadem a pauta e são muito importantes para fazer também com que o post bombe”, define o criador de conteúdo.

 

Fonte: Saiba Mais 

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