Araguaia: “Estamos mais perto da verdade”, diz juíza

Publicado em 04 de maio de 2011 às 10h15min

Tag(s): DItadura Militar



Interrompidas pelas chuvas de verão no final do ano passado, as buscas do Grupo de Trabalho Tocantins (GTT) pelos restos mortais dos desaparecidos na região do Araguaia durante a guerrilha (1972-1974) devem trazer resultados nas próximas expedições, que se iniciam em maio.
“Continuamos enfrentando a resistência dos comandantes em entregar à Justiça os documentos exigidos, mas depoimentos de camponeses e militares trouxeram pistas importantes, que podem finalmente nos levar ao paradeiro de corpos nessa nova etapa”, disse à Pública a juíza Solange Salgado, da 1a Vara da Justiça Federal, em Brasília.
Embora não possa revelar detalhes dos depoimentos para não expor os informantes a riscos e pressões, Solange não disfarçou seu otimismo em conversas com a Pública nos últimos dias: “Estamos mais perto da verdade”, afirmou a juíza que esteve na região durante a última expedição, que se encerrou no final de outubro de 2010. O GTT, comandado pelo ministério da Defesa, foi constituído em 2009 para cumprir a sentença proferida em 2003 pela juíza federal, em processo movido por familiares dos guerrilheiros mortos desde 1982. Até o momento, as buscas do GTT resultaram na localização de dois corpos ainda não identificados.
Os principais depoimentos de militares de baixa patente e camponeses, que ainda hoje vivem na região, no que se refere ao paradeiro dos corpos, são dos que participaram ou presenciaram fatos ocorridos durante a “Operação Limpeza”, ocorrida entre o final de 1974 e 1976. Muitos relatam a retirada de corpos nesse período, enterrados nos cemitérios de Xambioá e Marabá – e em outros locais da região onde presos foram torturados e mortos como a “Casa Azul” e as bases de Xambioá e Bacaba – que teriam sido embalados em sacos de lona e jogados na mata por helicópteros da Aeronáutica. Os relatos também são insistentes em outro ponto: o grande número de assassinatos de camponeses, acusados de colaborar com a guerrilha.
Centenas de camponeses mortos
As informações mais recentes obtidas pelo GTT – incluindo as realizadas por uma equipe da Justiça Federal – apontam para três conclusões até o momento: a primeira é que apesar das sucessivas operações “limpeza” – que também ocorreram nas décadas de 1980 e 1990 -, os corpos continuam no Araguaia, em locais de difícil acesso; a segunda é que o número de camponeses mortos pelas Forças Armadas e policiais da repressão é muito maior do que se tem notícia (“centenas”, segundo o ouvidor do GTT, Paulo Fonteles; “um número bem maior do que de guerrilheiros mortos”, segundo a juíza); e a terceira ainda hoje militares envolvidos no conflito monitoram a região para intimidar testemunhas e dificultar a localização dos corpos que, no entanto, não foram queimados nem retirados da região.
A intimidação das testemunhas, aliás, ocorre também durante as expedições do GTT, coordenada pelo Ministério da Defesa, que além dos necessários peritos e especialistas civis e militares, conta com mais de quarenta militares atuando no setor de “logística” da operação. “A chegada ostensiva de dezenas de homens fardados, armados, em uma região traumatizada inibe as testemunhas”, diz Diva Santana, representante dos familiares no Comitê de Supervisão do GTT – criado, exatamente, em virtude da reclamação dos parentes dos desaparecidos sobre a composição do grupo. Também há relatos de ameaças recentes sofridas por camponeses e ex-soldados que continuam vivendo na região.
Para evitar o aparato militar, uma equipe se deslocou de forma mais discreta, concentrando-se nos depoimentos dos que participaram das operações “limpeza” de 1975, enquanto as demais equipes ouviram principalmente os relatos históricos da guerrilha. Do trabalho dessa equipe, e de depoimentos ouvidos pela juíza em seu gabinete em Brasília é que vieram as informações que guiarão as próximas buscas.
“Tenho um princípio: recebo todo mundo que quer falar sobre o Araguaia”, explica a juíza Solange Salgado. “Tem gente que me procura dizendo ‘não quero morrer levando este segredo” e outros que têm medo de serem comprometidos no futuro”, diz. “Esse tem se mostrado um caminho bem mais promissor do que os documentos, até hoje não entregues pelas Forças Armadas”, afirma.
Fonte: Agência Pública, por Marina Amaral, de Brasília
 

ADURN Sindicato
84 3211 9236 [email protected]