Chile quer esclarecer morte de ilustres durante ditadura

Publicado em 08 de junho de 2011 às 09h58min

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Pablo Neruda, Salvador Allende, Eduardo Frei Montalva. As sombras seguem rodeando a morte de três dos cidadãos mais ilustres da história recente do Chile, um dos poetas mais lidos e famosos do mundo e dois presidentes democratas, que morreram em circunstâncias estranhas, nunca esclarecidas do ponto de vista judicial.
Por Soledad Gallego-Díaz, em El País
Pela primeira vez desde o golpe de Estado que comoveu o mundo, em 11 de setembro de 1973, e desde a morte de seu principal instigador, o general Augusto Pinochet, em 2006, a justiça chilena parece decidida a investigar formalmente os três casos e dar uma versão oficial.
A possibilidade de que Augusto Pinochet mandara envenenar Pablo Neruda, quando estava para se exilar no México, poucos dias depois do golpe militar, versão proposta esta semana pelo Partido Comunista Chileno, não soa tão extravagante.
De fato, esse foi o método utilizado, anos depois, para matar o ex-presidente democrata-cristão Eduardo Frei, que havia se convertido em uma referência da oposição à ditadura e que recebeu, muito provavelmente, uma injeção letal quando se encontrava na Clínica Santa Maria e se recuperava de uma cirurgia de hérnia de disco. A mesma coisa, especula-se, poderia ter acontecido com Neruda, doente de câncer de próstata e internado nessa mesma clínica, alguns anos antes.
A investigação que acaba de ser aberta baseia-se nas declarações de um assistente de Neruda, Manuel Araya, de 65 anos, e do embaixador mexicano naquela época [Gonzalo Martínez Corbalá], que sempre afirmou que visitou Neruda no dia anterior ao seu falecimento e que não achava que estivesse moribundo.
O presidente do México na época, Luis Echevarría, havia dado instruções precisas ao diplomata para que ajudasse a transladar o poeta e a sua esposa, Matilde Urrutia, para o México como convidado pessoal seu ou como exilado. De acordo com o embaixador, quando já estava tudo pronto, Neruda atrasou a viagem em dois dias e acabou morrendo nesse intervalo de tempo.
A morte de Neruda, cujo nome verdadeiro era Neftalí Reyes, comoveu o mundo, 12 dias depois do golpe de Estado e do falecimento de seu amigo o presidente Salvador Allende. A casa do poeta em Santiago foi invadida e revirada pelas forças militares, que cortaram com facas as peças de tapeçaria das paredes, destruíram os móveis e puseram fogo em muitos de seus livros.
O prêmio Nobel se encontrava gravemente enfermo de câncer em uma clínica da cidade e até agora sempre se deu como certo que os acontecimentos agravaram sua dolência e precipitaram o desenlace, mas que se produziu por causas naturais. Centenas de chilenos se arriscaram a sair às ruas naquele dia para acompanhar seus restos ao cemitério da capital, apesar da formidável presença militar que acompanhou o sepultamento.
Seus restos foram transladados posteriormente para a sua casa em Isla Negra. A Fundação que administra a obra do prêmio Nobel de Literatura assegurou, na sexta-feira passada, que não consta que “exista evidência alguma nem provas de nenhuma natureza que indiquem que Pablo Neruda tenha morrido por causa distinta do câncer avançado que o acometeu”.
O caso mais documentado até o momento é o do provável envenenamento de Eduardo Frei Montalva, que morreu aos 71 anos. A família sempre suspeitou que o político, que foi presidente do Chile entre 1964 e 1970, havia sido assassinado e tentou reabrir as investigações.
Um telegrama da Embaixada norte-americana em Santiago, filtrado pelo Wikileaks e publicado pelo El País, explicava que “menos de uma hora depois de sua morte, médicos da Universidade Católica vieram à Clínica Santa Maria e efetuaram a autópsia de Frei sem a autorização da família. A inusitada autópsia foi supostamente efetuada no quarto do hospital onde morreu, usando uma corda para pendurar o corpo, virado de cabeça para baixo, para drenar os fluidos em um recipiente. Alguns órgãos do corpo, particularmente aqueles cuja composição química poderia indicar envenenamento, foram tirados e destruídos e o corpo embalsamado”.
Embora a Embaixada norte-americana (que teve na época um papel crucial no golpe de Estado de 1973) considerava muito improvável poder esclarecer realmente os fatos, o atual presidente Sebastián Piñera ordenou uma nova investigação. “Queremos que a morte de um presidente da República não permaneça nas sombras”, declarou.
A morte de Salvador Allende também não foi esclarecida judicialmente e também será objeto de uma nova investigação. Até agora a versão comumente aceita indica que o presidente se suicidou para não se render às tropas rebeldes, mas a possibilidade de que o seu corpo apresente dois impactos de bala abriu novamente as conjecturas sobre um eventual suicídio assistido ou, mesmo, um assassinato.

Fonte: Portal Vermelho

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