Nobel de Química vai para cristal que "não devia existir"

Publicado em 06 de outubro de 2011 às 15h35min

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Os meticulosos cadernos de laboratório do israelense Daniel Shechtman permitem datar com precisão a descoberta que acaba de render a ele o Prêmio Nobel em Química deste ano. Foi na manhã de 8 de abril de 1982 que ele usou uma série de pontos de interrogação para marcar sua surpresa com o que estava vendo no microscópio: um cristal que não deveria existir.
Para o comitê do Nobel, ele "modificou a concepção fundamental do que é um objeto sólido", mostrando que os átomos podem se organizar em estruturas de grande complexidade, que não se repetem. Por isso, embora o achado ainda tenha pouca aplicação prática, ele foi considerado digno do prêmio.
Para Nivaldo Speziali, presidente da Sociedade Brasileira de Cristalografia, o ganhador mostrou "que a periodicidade estrutural [a repetição regular das mesmas estruturas] não é necessária na definição de cristal". Há exemplos de materiais artificiais e naturais com os quasicristais (como são chamados) do israelense. A arte medieval bolou estruturas parecidas.
Teimosia - Shechtman precisou de muita persistência, pois a grande maioria dos cientistas duvidou de seus achados. Um deles era Linus Pauling, ganhador do Nobel em 1954, conta Speziali. Por conta das reações negativas, o israelense chegou a ser expulso do laboratório onde trabalhava nos EUA. Hoje ele está no Instituto de Tecnologia de Israel, em Haifa.
Em entrevista dada ao comitê do Nobel, Shechtman disse que sua descoberta lhe ensinou que "o bom cientista é humilde a ponto de estar disposto a considerar novidades inesperadas e violações de leis estabelecidas".
Os quasicristais descobertos são, em sua maioria, criados artificialmente quando uma liga metálica derretida é esfriada rapidamente em uma superfície giratória. Sua estrutura tridimensional dificulta a propagação de ondas, o que define suas características peculiares. Eles são maus condutores de calor e de eletricidade, têm baixa fricção e aderência, mas são altamente resistentes e, por isso, prometem grande aplicabilidade.
Seriam bons para aço reforçado, lâminas e agulhas cirúrgicas, frigideiras e motores a diesel. Mas poucas aplicações concretas já foram desenvolvidas devido ao alto custo de produção deles. Arte islâmica já trazia padrões dos quasicristais
AIQ - O ano de 2011 é celebrado como o Ano Internacional da Química, e o Prêmio Nobel em Química dado a um físico coroa o aspecto interdisciplinar da área. A descoberta dos quasicristais, por exemplo, tem relações com a física, com a engenharia de materiais, com a matemática e até com as artes não figurativas, sem falar na própria química, é claro. O padrão não repetitivo presente nos quasicristais tem raízes matemáticas antigas. A razão das distâncias entre os átomos nesses materiais está sempre relacionada à proporção áurea, descrita pelo matemático Fibonacci no século 13 e conhecida já na Antiguidade.
Na década de 1970, Roger Penrose usou a proporção áurea para produzir mosaicos aperiódicos, imagens compostas de combinações de formas geométricas que são infinitamente variadas. Os mosaicos da arte islâmica medieval, como o do palácio de Alhambra, na Espanha, também têm o mesmo padrão dos mosaicos de Penrose e dos quasicristais.

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