Fora de ajuste fiscal de Dilma, universidades lideram contratações

Publicado em 10 de outubro de 2011 às 15h11min

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Dois de cada três servidores admitidos por concurso público no governo Dilma Rousseff vão trabalhar, como professor ou técnico administrativo, em universidades e outras instituições federais de ensino superior. Com uma proporção de docentes por alunos elevada para padrões internacionais e para as próprias metas brasileiras, as universidades são a principal exceção no programa de ajuste fiscal deste ano, que proibiu contratações na maior parte dos ministérios.
Levantamento feito pela Folha mostra que, de janeiro a agosto -quando foram contratados no total 16.309 servidores- 4.204 professores e outros 6.669 funcionários ingressaram nos quadros das instituições de ensino superior mantidas pela União. Trata-se de um contingente semelhante ao dos empregados pela fábrica da Volkswagen em São Bernardo do Campo (SP), a maior da montadora no País.
As universidades já puxavam o crescimento do funcionalismo no governo passado, mas as proporções nunca foram tão altas como agora. Até o lançamento do programa de expansão do ensino superior, batizado de Reuni, professores e técnicos respondiam por um quarto das contratações do Executivo em 2007. No ano passado, pela metade.
O programa se tornou uma das principais bandeiras da propaganda política petista. Lula se gabava de ter sido o presidente que mais criou universidades na história - embora, das 14 mencionadas, nove sejam resultado de fusão, desmembramento ou ampliação de instituições preexistentes.
Os resultados também embalam o discurso do ministro Fernando Haddad (Educação), pré-candidato à Prefeitura de São Paulo nas eleições de 2012 com apoio do ex-presidente e também responsável pela estratégia de ampliação do ensino técnico.
Controvérsia - Administrativamente, os dados são objeto de controvérsia. O censo do ensino superior realizado em 2009 pelo MEC apontou 72,2 mil docentes em atividade para 752,8 mil matrículas na rede federal, o que significa uma relação de um professor para 10,4 alunos.
Esse número é comparável ao praticado em países muito mais ricos, como Japão, Noruega e Islândia. Na Inglaterra, na França e nos EUA, há mais de 15 alunos por professor. Na rede privada brasileira, são 17,3. O dado oficial do ministério, no entanto, leva em conta também variáveis como o tempo de duração de cada curso. Por isso, a própria pasta calcula que há um professor para 13 estudantes universitários. A meta, como o programa de expansão, é elevar esse número a 18 até 2016.
O secretário de Educação Superior, Luiz Cláudio Costa, diz que houve mais contratações de professores para garantir a expansão e também a manutenção das universidades federais. Parte dos novos servidores são professores substitutos ou temporários. A outra tem cargo de professor efetivo (isto é, faz parte do quadro de funcionários). As universidades federais que mais receberam professores efetivos foram a UFBA (133), a UFPA (130), a UFRJ (126) e a UnB (106).
Universidade federal é cara e não tem tanta qualidade
Análise de Simon Schwartzman defende que docente não seja concursado
O Brasil tem poucos estudantes de nível superior para o seu tamanho, 78% das matrículas são em instituições privadas e a maior parte das universidades públicas está nas capitais. Então, o governo dá dinheiro para as universidades públicas contratarem mais professores e abrirem mais vagas e anuncia a criação de novas universidades no interior de estados como Bahia e Pernambuco. O que pode haver de errado nisso?
Muita coisa, a começar pelo fato de que as universidades federais são muito caras e, com as exceções de sempre, não têm nem de longe a qualidade e a relevância que seria de se esperar.
Uma razão é que seus professores são contratados como funcionários públicos, nunca podem ser despedidos e recebem sempre a mesma coisa, pelo princípio da isonomia, como se dividissem seu tempo entre ensino e pesquisa - embora só uma pequena parte deles realmente faz trabalhos de pesquisa de alguma relevância.
A segunda razão é que as universidades federais são governadas por seus professores, funcionários e estudantes, que cuidam de seus interesses e não precisam estar atentos nem responder a metas, demandas e necessidades da região em que estão, nem em relação aos cursos que oferecem, nem em relação aos trabalhos de pesquisa e extensão que realizam na instituição.
Não é assim que as universidades públicas são formadas e funcionam nos países que levam a educação superior a sério. Nesses países, cada vez mais, as universidades têm missões claras a cumprir, seus dirigentes respondem a conselhos externos com a presença ativa de representantes do setor público e da sociedade, que zelam para que elas cumpram seus objetivos. Os professores também não são funcionários públicos, mas contratados de forma a impedir que se perpetuem nos cargos se não tiverem o desempenho esperado.
Nada sabemos sobre as missões dessas novas universidades e cursos que estão sendo criados, sobre o que será feito para que os professores que estão sendo contratados tenham as qualificações e o desempenho necessários, nem que existam mecanismos para avaliar e corrigir os rumos das instituições que não funcionem. Tudo indica que continuaremos tendo mais do mesmo, ou pior.
Simon Schwartzman é pesquisador do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade e foi presidente do IBGE.

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