MPF denuncia major da ditadura

Publicado em 14 de março de 2012 às 11h42min

Tag(s): Direitos Humanos



O Ministério Público Federal vai denunciar, na Justiça Federal em Marabá o coronel da reserva do Exército Sebastião Curió Rodrigues de Moura pelo crime de sequestro qualificado de cinco pessoas na Guerrilha do Araguaia. Curió comandou as tropas que atuaram na região em 1974, época dos desaparecimentos de Maria Célia Corrêa (Rosinha), Hélio Luiz Navarro Magalhães (Edinho), Daniel Ribeiro Callado (Doca), Antônio de Pádua Costa (Piauí) e Telma Regina Corrêa (Lia).
Em entrevista concedida ontem, em Brasília, quatro procuradores da República envolvidos na investigação sustentaram que mesmo após 38 anos da guerrilha é possível responsabilizar Curió pelo sumiço dos militantes. De acordo com eles, o que ocorreu no caso foi um sequestro, crime que tem caráter permanente já que as vítimas continuam desaparecidas.
Por causa desse caráter permanente, segundo os procuradores, é possível denunciar Curió mesmo depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) ter reconhecido em 2010 a validade ampla, geral e irrestrita da Lei de Anistia. Promulgada em 1979, a lei anistiou pessoas punidas por ações contra a ditadura e, conforme a interpretação estabelecida na época, agentes do Estado acusados de violações a direitos humanos. A tese é polêmica e deverá chegar ao STF.
Os procuradores também afirmam que a lei anistiou os crimes praticados até 15 de agosto de 1979. No entanto, segundo eles, o crime de sequestro ainda persiste e, portanto, a lei não beneficiou Curió. "O fato concreto e suficiente é que após a privação da liberdade das vítimas, ainda não se sabe o paradeiro de tais pessoas e tampouco foram encontrados seus restos mortais", argumentam os procuradores.
"Por se tratar de crimes permanentes, cuja consumação encontra-se em curso, algo precisava ser feito", afirmou o procurador Tiago Modesto Rabelo, um dos autores da denúncia. Os procuradores também citaram decisões recentes do STF que autorizaram a extradição de militares argentinos acusados do mesmo crime durante a ditadura naquele país.
A denúncia é baseada principalmente em provas testemunhais, como relatos de que as vítimas teriam sido capturadas, levadas para a base militar, colocadas em helicópteros e nunca mais vistas. Também foram descritos maus tratos que teriam sido praticados nas bases militares comandadas por Curió.
"As violentas condutas de sequestrar, agredir e executar opositores do regime governamental militar, apesar de praticadas sob o pretexto de consubstanciarem medidas para restabelecer a paz nacional, consistiram em atos nitidamente criminosos, atentatórios aos direitos humanos e à ordem jurídica", sustenta o Ministério Público Federal.
Foto alimentou luta interna entre militares
Brasília (AE) - A morte do jornalista Vladimir Herzog numa cela do DOI-Codi em São Paulo, em 25 de outubro de 1975, alimentou uma disputa interna de poder na ditadura militar. Documento divulgado na semana passada pelo deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) constitui peça importante no quebra-cabeça desse caso e serve como mais uma prova de que a famosa foto do jornalista enforcado dentro da cela, divulgada pelos militares, foi manipulada pela ditadura.
Uma carta enviada em 23 de janeiro do ano seguinte pelo general Newton Cruz ao general João Figueiredo, chefe dele no Serviço Nacional de Informações (SNI), dá mais detalhes dessa disputa e destaca que um panfleto com uma foto do corpo de Herzog, não divulgada à época pela imprensa, tinha a mesma rubrica usada em manifestos anônimos produzidos contra ele dentro do regime de exceção.
Divulgada na íntegra pelo deputado no site www.leidoshomens.com.br, a carta cita uma foto pouco conhecida do corpo de Herzog com elementos que escancaram a farsa do suicídio. Essa imagem citada por Newton Cruz mostra as barras de ferro da janela da cela em que o corpo de Herzog foi colocado. A extremidade de uma cinta que envolveu o pescoço do jornalista foi amarrada na parte inferior de uma das barras de ferro, a 1,63 metro do piso da cela.
Já na época se questionou que o corpo não estava suspenso: os joelhos estavam dobrados no chão, um dos argumentos que derrubaram em 1975 a versão do suicídio. Mas a foto divulgada naquele ano pelo Instituto de Criminalística não exibia a parte superior das barras, para dificultar a compreensão de que Herzog foi amarrado e não se amarrou.
Um dos casos mais emblemáticos da distensão da ditadura militar, o assassinato de Herzog marcou também o acirramento da disputa de poder entre comandantes da ditadura. Na carta, Newton Cruz aponta que seus "detratores" eram do Centro de Informações do Exército, o antigo CIE, atual CIEX.
Aparentemente, Cruz teria feito comparações entre o panfleto com a foto do jornalista e outros que o difamavam e o chamavam de "traidor e cachaceiro". "Alguns dados interessantes: a fotografia não foi publicada nos jornais", escreveu Newton Cruz a Figueiredo. "Até onde sei, foi difundida pelo CIE, em cópia xérox, para outros centros de informações."
"A carta de Newton Cruz para Figueiredo não mostra preocupação com o episódio Herzog. A preocupação é com a luta interna", destaca o deputado Miro Teixeira. Autor da reportagem, Miro diz estar matando saudade do tempo em que atuou como jornalista. "Temos uma equipe no site que está disposta a fazer muitas reportagens."
Manifesto cobra agilidade para instalar comissão
São Paulo (AE) - A Associação Juízes para a Democracia (AJD) divulgou ontem um manifesto no qual cobra do governo a rápida instalação da Comissão da Verdade. Os 130 signatários do documento também defendem o encaminhamento de ações no Judiciário. "Nós, juízas e juízes brasileiros, exigimos que o País quite a enorme dívida que possui com o seu povo e com a comunidade internacional, no que diz respeito à verdade e justiça dos fatos praticados pela ditadura militar", diz o texto. Aprovada no ano passado pelo Congresso e sancionada em novembro pela presidente Dilma Rousseff, a comissão ainda não começou a funcionar porque não foram indicados os sete nomes de personalidades que irão integrá-la.
O número de assinaturas no manifesto deve aumentar, segundo a juíza paulista Kenarik Boujikian Felippe, integrante da associação. "O tema desperta muito interesse na comunidade jurídica", afirmou. É o segundo manifesto lançado nos últimos dias cobrando do governo a instalação da comissão. O primeiro foi uma iniciativa de produtores, diretores e atores de cinema.
O tema está sendo debatido em centrais sindicais e em áreas do movimento social. Indiretamente, trata-se de uma reação às manifestações da reserva que recentemente atacaram o governo e as iniciativas em curso no País para esclarecer fatos ocorridos no período da ditadura. O temor dos militares está relacionado diretamente às tentativas de responsabilização por crimes ocorridos naquele período. Eles alegam que a Lei da Anistia, de 1979, beneficiou também os agentes de Estado.
O manifesto deixa claro que a atuação da comissão, destinada a "melhorar o acesso à informação e dar visibilidade às estrutura de repressão", não é o único caminho a ser seguido. Para eles é preciso encaminhar ações na área do Judiciário. "Estamos certos, como decidido pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, que as atividades e informações que, eventualmente, recolha (a Comissão de Verdade) não substituem a obrigação do Estado de estabelecer a verdade e assegurar a determinação judicial de responsabilidades", diz o texto.
Fonte: Agência Estado
 

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